Nesta semana, dezenas de pessoas compareceram a um tribunal em Detroit, nos Estados Unidos, para testemunhar contra o médico Farid Fata, chamado por alguns de "Doutor Morte".
Elas chegaram ao local fragilizadas, apoiadas por bengalas, alguns com suas articulações enfaixadas e quase todas exaustas pelo desgaste físico e psicológico causado por anos de quimioterapia.
Ali, revelaram um fato aterrorizante: seu oncologista havia mentido para elas, que nunca haviam tido câncer.
Ao menos 553 pessoas se submeteram a este duplo sofrimento (dos efeitos colaterais do tratamento e o fato de acharem que tinham uma das doenças mais fatais do mundo) sem padecer deste mal, segundo a queixa criminal aberta pela polícia federal americana, o FBI, contra Fata.
Durante os testemunhos das vítimas, realizados nesta semana, Fata ficou sentado a três metros delas. Imóvel, escutava enquanto elas contavam sobre o que passaram.
"Mesmo que não esteja morta, sou uma sombra do que era", disse Maggie Dorsey, uma das pacientes. "Há dias em que não consigo nem ficar de pé."
Monica Flagg disse à emissora CBS estar furiosa: "Não posso crer que um médico tenha traído tanta gente desta forma".
O FBI afirma que Fata não apenas diagnosticou e tratou casos falsos de câncer como também prescrevia tratamentos caros e agressivos a pacientes que estavam em fase terminal e não teriam chances de sobreviver.
"Eu te odeio, Farid Fata", disse Laura Stedfeld ao médico em tom de voz elevado. "Você é repugnante. Você é um monstro. Evidentemente, é um covarde já que não consegue nem me olhar. Você me envenenou, me torturou e matou meu pai."
Alguns especialistas que testemunharam diante do juiz Paul D. Borman, na cidade de Detroit, disseram que o médico administrou uma substância chamada rituximab.
Ela deve ser aplicada no máximo oito vezes em linfomas agressivos, mas Fata chegou a aplicá-la 94 vezes em um paciente.
As motivações do médico eram claramente econômicas, segundo a denúncia da acusação. Entre 2007 e 2013, Fata apresentou faturas num total de US$ 225 milhões (R$ 725 milhões) ao Medicare, o sistema de seguro de saúde estatal dos Estados Unidos.
Esta fraude era feita por meio da sociedade Michigan Hematology Oncology, que dispunha de sete clínicas no Estado de Michigan.
A quimioterapia é um tratamento que permite destruir as células cancerosas que provocam metástase ou que tenham se espalhado pelo corpo. É administrada em ciclos que variam entre dias e meses.
Mas, como se trata de uma medicação agressiva, ela não afeta apenas as células doentes, mas também aquelas saudáveis. Por isso, pode causar problemas de saúde e deixar doentes pessoas que não tenham câncer, como foi o caso das vítimas de Fata.
Estes efeitos colaterais afetam de forma distinta a cada pessoa, de acordo com sua sensibilidade e estado de saúde.
Segundo a Sociedade Americana Contra o Câncer, as células sãs com probabilidades de serem prejudicadas pela quimioterapia são aquelas que produzem sangue na medula óssea, assim como as da boca, do trato digestivo, do sistema reprodutor e capilares.
Alguns medicamentos quimioterápicos podem gerar danos a células do coração, rins, bexiga, pulmões e sistema nervoso.
Outros tipos de quimioterapia causam efeitos colaterais a longo prazo, como infecções no coração ou danos aos nervos, assim como problemas de fertilidade.
A organização americana esclarece que a maioria dos efeitos desaparece lentamente após o fim do tratamento, mas adverte que "em certos, casos eles podem durar por toda a vida".
No julgamento, Fata declarou-se culpado de 16 acusações, entre elas conspiração, fraude e lavagem de dinheiro - e agora está sendo forçado a ouvir os testemunhos das pessoas cujas vidas arruinou antes de o juiz decretar sua sentença.
A promotoria demanda uma pena de prisão de 175 anos para o médico, enquanto seus advogados pedem que este tempo seja reduzido para 25 anos.