Em
alegações finais - peça decisiva na ação penal em que Bumlai é réu por
corrupção, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta de instituição
financeira -, apresentada ao juiz Sérgio Moro nesta sexta-feira, 12, a
defesa diz que ele 'sabe ter cometido um grave equívoco, que redundou na
acusação, tem consciência de seus atos e de muitos deles se
arrepende'.Bumlai é protagonista do emblemático empréstimo de R$ 12
milhões que tomou junto ao Banco Schahin, em outubro de 2004.
O
dinheiro, segundo o próprio pecuarista, foi destinado ao PT, na ocasião
em dificuldades de caixa. Segundo a Lava Jato, em troca do empréstimo, o
Grupo Schahin foi favorecido por um contrato de US$ 1,6 bilhão sem
licitação com a Petrobrás, em 2009, para operar o navio sonda Vitória
10.000. Lula, que não é acusado nesta ação, teria dado a 'bênção' ao
negócio - o que é negado pela defesa do petista."A prova dos autos
explica o que de fato aconteceu: o PT precisava de dinheiro para, entre
outras providências, quitar dívidas da campanha da prefeitura de
Campinas", alega a defesa. "Por sua vez, o Banco Schahin, representado
pelo então presidente Sandro Tordin e seus controladores Salim e MIlton
Schahin, tinha dinheiro disponível e muito interesse em se aproximar do
Governo Federal e do Partido dos Trabalhadores para se beneficiar de
novas 'oportunidades de negócios'...
Nesse
contexto, como esclareceu Bumlai, 'o empréstimo já estava totalmente
aprovado' e 'só precisava de um trouxa' 'pra assinar e ficar responsável
por ele'22. E o 'trouxa' escolhido foi José Carlos Bumlai que, além de
ser conhecido de todos os envolvidos, era adimplente23 e amigo do
presidente Lula24. Eis o trouxa perfeito!"DOCUMENTO: CARTADA DECISIVA DO AMIGO DE LULA
Ao
final do documento de 70 páginas, a defesa pede a Moro que devolva a
Bumlai a liberdade."Na contramão do que tem sido comum nos processos
envolvendo a Força-Tarefa da Lava-Jato, José Carlos Bumlai não é
lobista, não é empreiteiro, não é político e tampouco se beneficiou de
contratos milionários com o Governo Federal. Tudo o que tinha a
esclarecer, foi esclarecido. Bumlai errou e arrepende-se imensamente.
Afinal, cometeu falsidades documentais que possibilitaram a irrigação
ilícita de recursos ao Partido dos Trabalhadores, sucedida,
posteriormente e à sua total revelia, de uma compensação de favores
escusa entre esta agremiação partidária e o Grupo Schahin em negociações
com a Petrobrás. Mas, a César o que é de César!"
Enfraquecido
por um câncer na bexiga e problemas cardíacos, Bumlai, de 71 anos, há
alguns meses foi autorizado pelo juiz Moro a fazer tratamento em casa.
Mas, nesta quinta-feira, 11, o juiz da Lava Jato mandou o amigo de Lula
voltar para a prisão em regime fechado.Nas alegações finais, os
advogados de Bumlai argumentam. "Ainda que a acusação insista em apontar
José Carlos Bumlai como grande 'protagonista' dos fatos, o que a
instrução comprovou é aquilo que ele mesmo disse em seu interrogatório
em Juízo: foi apenas o 'trouxa', o homme de paille, de que o Partido dos
Trabalhadores e o Banco Schahin precisavam para simular o empréstimo de
R$12 milhões. Nada mais do que isso!"
"Os
erros que cometeu são sim condenáveis, mas, diferentemente do que
sustenta o Ministério Público Federal, estão longe de configurar
qualquer um dos crimes apontados na denúncia", insistem os advogados do
pecuarista, um grupo de seis criminalistas - Jacinto Miranda Coutinho,
Daniella Meggiolaro, Edward Rocha de Carvalho, Conrado de Almeida Prado,
Lyzie de Sousa Andrade Perfi e Fernando Bertolino Storto."Os meses em
que esteve na cadeia somados ao tempo em que permanece enfurnado e
doente em casa já foram mais que suficientes para castigá-lo pelas
falsidades que praticou para tomar e quitar um empréstimo que jamais lhe
beneficiou", enfatizam os advogados.
"Arrepende-se,
pois sua trajetória de vida até meados de 2004 sempre fora escorreita e
ilibada. Arrepende-se, pois, sem nenhuma intenção, acabou envolvendo um
grande amigo e parceiro de negócios em uma 'fria'1. Arrepende-se, pois
seu filho Maurício, injustamente, também responde a essa ação penal.
Arrepende-se, pois não há dificuldade em dizer não e receio de
desagradar ao partido político da situação que justifiquem a realização
de um empréstimo simulado. A confissão (de Bumlai) foi como um bálsamo
em sua vida, pois com ela conseguiu tirar de suas costas um peso que
vinha carregando há mais de 10 anos, passando, finalmente, a dormir em
paz."A defesa alega incompetência de Moro para o caso, aponta 'a
imprestabilidade das provas obtidas por interceptações telefônicas
ilegais', a 'ilegalidade da interceptação telemática' e diz que 'é
inepta' a denúncia do Ministério Público Federal."
O
fetiche em torno de sua figura sempre foi grande, mas a imagem de
articulador do Governo Federal e de intermediário de supostos negócios
escusos de interesse do então presidente da República Luiz Inácio Lula
da Silva finalmente desmilinguiu-se, desmantelou-se", segue a defesa. "O
que restou dessa ação penal foi a constatação de que as bandalheiras
envolvendo a Petrobrás, seus dirigentes e funcionários, partidos
políticos e agentes públicos passam ao largo de José Carlos Bumlai.""A
amizade entre Bumlai e o ex-chefe do Executivo existe e não tem como ser
negada. Mas dela nada mais se extrai, a não ser uma enorme injustiça,
que está na iminência de se desfazer."A defesa aponta para um capítulo
do caso que envolve o então tesoureiro do PT, João Vaccari Neto - preso
na Lava Jato desde abril de 2015.
"Como o
próprio Bumlai admitiu perante esse Juízo, ele cometeu um 'grande erro'
ao consentir com as ações arquitetadas pelos representantes das partes
interessadas no empréstimo, ou seja, o Banco Schahin e o Partido dos
Trabalhadores, concordando em realizar falsamente o mútuo em seu nome.
Ao perceber que o empréstimo não seria quitado como prometido, o
peticionário, é verdade, procurou o responsável pelas finanças do PT na
época para cobrar uma solução, já que a iniciativa de pagar a dívida com
a entrega de um bem imóvel havia sido rechaçada pelos credores. Sem
entrar no mérito de como isso seria feito, afinal, esse problema não era
seu, Bumlai apenas cobrou uma posição do tesoureiro João Vaccari, tendo
este lhe dito depois que a quitação viria assim que fossem acertados
negócios entre a Petrobrás e o Banco Schahin, cujos interesses eram bem
maiores do que receber de volta os 12 milhões emprestados."
"José
Carlos Bumlai é um senhor de 71 anos, primário e de bons antecedentes e
acometido por uma série de enfermidades recentemente descobertas",
ponderam os defensores. "Mesmo assim, em nenhum momento criou óbice ao
trâmite do processo ou reiterou as condutas a ele atribuídas, cessadas
no longínquo ano de 2009. Ademais, conforme comprovado nos autos, não
comandou ou liderou a prática de qualquer crime, tampouco se utilizou do
nome do ex-presidente Lula para fins ilícitos."
"Muito
embora não tenha assinado nenhum acordo de colaboração premiada,
(Bumlai) confessou voluntária e espontaneamente suas condutas,
auxiliando efetivamente para o deslinde não só das investigações que
redundaram nesta ação penal.""Apesar da irresignação da acusação, a
prova dos autos revela que Bumlai não praticou os delitos de corrupção
passiva, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O único crime que
pode ser a ele atribuído é o de falsidade documental, já prescrito,
motivo pelo qual sua absolvição é medida de rigor."
A
defesa contesta, ainda, o que classifica de desproporcional constrição
patrimonial imposta a Bumlai. "Para garantir futura indenização pelos
prejuízos supostamente causados pelos delitos apurados nesta ação penal,
Bumlai e seus familiares sofreram constrição patrimonial de 23 veículos
e 22 imóveis. Não obstante, há nesta ação penal outros corréus que
tiveram atuação bem mais intensa que a de José Carlos Bumlai, que
lucraram com o crime, que causaram prejuízo à Petrobrás, mas que,
estranhamente, não tiveram nenhum de seus bens bloqueados. Esses
acusados - exempli gratia os afagados e protegidos donos do Banco
Schahin - inclusive, possuem liquidez o bastante para garantir e reparar
o dano de forma bem mais rápida e eficiente que Bumlai."Ao pedir a Moro
que mande soltar Bumlai, os advogados destacam um ponto que reputam
importante.
"Ele jamais quebrou as
condições estabelecidas para a prisão domiciliar, de modo que não há
nenhum indicativo de que sua manutenção nesse regime possa colocar em
risco a ordem pública ou a aplicação da Lei Penal e, ao mesmo tempo,
permitirá que ele possa cuidar dignamente de sua saúde. Por esse motivo,
o defendente dirige um apelo a esse Juízo: pede, na remota hipótese de
condenação, a possibilidade de responder o processo em liberdade ou, ao
menos, a fixação de uma medida cautelar menos gravosa, como o uso da
tornozeleira eletrônica em regime domiciliar."
Os
advogados anotam que o Ministério Público Federal quer a condenação e a
manutenção do encarceramento do amigo de Lula, 'mesmo já tendo passado
meses na prisão, mesmo diante de seu debilitado quadro de saúde, mesmo
diante de sua postura altamente colaborativa'.A defesa define Bumlai
como 'um empresário probo, um benfeitor de grandes projetos sociais, que
sempre prezou por ajudar ao próximo e que nunca se beneficiou de um
único tostão proveniente do empréstimo tomado em seu nome ou da
inescrupulosa empreitada envolvendo a maior estatal brasileira'."O
acusado confia no bom senso desse Juízo, que haverá de julgar
improcedente todas as pretensões da acusação", concluem os advogados de
Bumlai.
"Assim, aguarda serenamente sua
absolvição, seja em razão da atipicidade dos fatos que lhe são
imputados, seja em razão da comprovação de que não participou dos crimes
que lhe são atribuídos. Mesmo que V. Exa. assim não entenda, a acusação
não pode prosperar em razão da ilicitude originária da prova colhida
nos autos e das demais nulidades que permeiam o feito."O pedido
derradeiro. "Se, por absurdo, sobrevier sua condenação, aguarda-se a
fixação das penas no mínimo legal, com a aplicação das atenuantes do
artigo 65, incisos I e III, alínea d, do Código Penal e das causas de
diminuição de pena previstas no artigo 1º, §5º, da Lei n° 9.613/98 e no
artigo 29, § 1°, do Código Penal, com o cumprimento em regime inicial
aberto ou semi-aberto."