Lava Jato chega ao comando do esquema de corrupção na Petrobrás
Por Fausto Macedo, Julia Affonso e Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba
A
condenação de executivos da Camargo Corrêa e a denúncia formal contra
os presidentes e ex-dirigentes das duas maiores empreiteiras do País,
Odebrecht e Andrade Gutierrez, abrem nova fase das investigações da
Operação Lava Jato, que atingirá o PT e o PMDB como líderes do esquema
de corrupção em conluio com o comando do cartel, que fatiava obras da
Petrobrás, mediante o pagamento de propina, desde 2004.
Com
a chegada dos primeiros documentos oficiais da Suíça, após acordo de
cooperação internacional entre os dois países, a força-tarefa
de procuradores da Lava Jato acredita ter aberto "uma janela"
nas apurações que levarão à comprovação de uso de contas secretas
dos quatro núcleos do esquema: empresarial, político, de
operadores financeiros e de agentes públicos.
Além
de chegar às contas secretas das empreiteiras, dos políticos,
dos dirigentes da Petrobrás e dos operadores de propina, os
investigadores vão espraiar a devassa em contratos, antes centrada na
estatal, de outras áreas dos governos Luiz Inácio Lula da Silva
(2003-2006 e 2007-2010) e Dilma Rousseff (2011-2014).
Uma
das prioridades é o setor energético e envolve as obras de
grandes usinas, como Belo Monte, no Pará, e Angra 3 - que
tiveram investimentos bilionários. As delações de dois executivos da
Camargo Corrêa, que confessaram cartelização e pagamentos de propina
nessas obras, reforçaram as suspeitas levantadas após o ex-diretor de
Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa confirmar que o esquema
de propina era generalizado.Primeiro delator da Lava Jato, Costa era
sustentado no cargo por um consórcio entre PP e PMDB, com sustentação de
petista. Ele confessou ter agido em nome desses partidos e atribuiu a
maior parte de sua fortuna oculta na Suíça à Odebrecht.
"Temos
elementos para apontar que o esquema de cartel e corrupção foi além da
Petrobrás", afirmou o procurador regional da República Carlos Fernando
Lima, um dos integrantes da força-tarefa da Lava Jato.
Núcleo empresarial.
A sentença dos três executivos da Camargo Corrêa, Dalton dos Santos
Avancini (ex-presidente), Eduardo Leite (ex-vice-presidente) e João
Ricardo Auler (ex-presidente do Conselho de Administração), na última
semana, foi a primeira condenação do núcleo empresarial do esquema.
"No
período compreendido entre 2004 e 2014, uma grande
organização criminosa estruturou-se com a finalidade de praticar
delitos no seio e em desfavor da Petrobrás", sustenta o MPF. Um prejuízo
de pelo menos R$ 19 bilhões.
Segundo a
força-tarefa da Lava Jato, o núcleo empresarial, em conluio com o núcleo
político, detinha o comando do esquema. Por meio dessa união, houve uma
sistematização da corrupção, à partir do maior caixa de investimentos
do governo federal, a Petrobrás, nas demais esferas.Avancini e Leite
foram condenados pelo juiz da 13ª Vara Federal, em Curitiba, Sérgio Moro
- que conduz os processos em primeiro grau da Lava Jato -, a 15 anos e
dez meses de reclusão, mas como fizeram delação premiada foi concedido a
eles o direito ao regime de prisão domiciliar. Auler pegou nove anos e
seis meses de reclusão.
Eles
foram responsabilizados pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro
e organização criminosa.Nesta semana, Moro decidirá se leva ao banco dos
réus os presidentes da Odebrecht, Marcelo Bahia Odebrecht, e Andrade
Gutierrez, Otávio Marques Azevedo, e seus executivos, pelos mesmos
crimes em que os ex-dirigentes da Camargo Corrêa foram condenados.Com a
possibilidade de abertura de processo contra executivos das duas maiores
empreiteiras do País, a Lava Jato atingirá, ao mesmo tempo, o topo das
pirâmides do núcleo empresarial e político do esquema.
PT e PMDB.
Para o Ministério Público Federal, a primeira condenação de executivos
do cartel da Lava jato referendou a denúncia de que PT e PMDB, com apoio
do PP, dividiam indicações nos cargos estratégicos da Petrobrás, por
meio dos quais arrecadavam de 1% a 3% dos grandes contratos. A estatal
já incluiu em seu balanço os deviso de R$ 6,2 bilhões.Para a
força-tarefa da Lava Jato, o PT teria sistematizado a cobrança de
propina em grandes contratos estatais, estipulando percentuais fixos de
cobrança, operadores de corrupção, em conjunto com o cartel de
empreiteiras. O partido tem negado envolvimento em irregularidades.
No
caso do PT, a Lava Jato tem mais do que confissões de delatores para
apontar que recursos desviados de obras da Petrobrás chegaram aos cofres
do partido. Documentos entregues pelo empresário Augusto Ribeiro
Mendonça, dono do grupo Setal, em sua delação deram o caminho do
dinheiro que chegou aos cofres do partido, via ex-tesoureiro
João Vaccari Neto.Indicado pelo ex-diretor de Serviços da Petrobrás
Renato Duque - cota do PT, preso desde março -, Vaccari cuidou do
pagamento de R$ 4 milhões para o partido, via doações oficiais ao
partido e anúncios pagos em editora ligada à legenda, indica o MPF.
No
caso do PMDB, a peça-chave para os investigadores da Lava Jato é
o lobista e operador de propinas Fernando Antonio Soares Falcão,
o Fernando Baiano. Preso desde dezembro e prestes a ser condenado
pelo recebimento de US$ 40 milhões junto com o ex-diretor de
Internacional Nestor Cerveró, Fernando Baiano foi denunciado nesta
sexta-feira como operador de propina da Andrade Gutierrez.
Prova cabal.
As quebras dos sigilos bancários de contas mantidas por offshores na
Suíça, enviadas por autoridades daquele país, foram consideradas provas
cabais do envolvimento de executivos da Odebrecht e da Andrade
Gutierrez, bem como de ex-diretores da Petrobrás indicados pelo PT e
PMDB no esquema de corrupção e lavagem.Os ex-diretores da Petrobrás
Renato Duque (Serviço), Nestor Cerveró e Jorge Luiz Zelada (ambos
Internacional) são três dos alvos dessas apurações. Os três estão presos
preventivamente em Curitiba.São novas contas, entre elas cinco que as
autoridades da Suíça enviaram documentos ligando à subsidiárias da
Odebrecht. Outras quatro ligadas a operadores de propina e outras de
ex-diretores da Petrobrás. Há ainda contas do lobista do PMDB Fernando
Baiano.
Duas esferas. Como
os processos envolvendo políticos com direito a foro especial, por
prerrogativa de função, são competência exclusiva do Supremo Tribunal
Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os elos do PT e
do PMDB alvos da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba serão os agentes
públicos sustentados nos cargos pelos partidos e nomes que não ocupam
mais cargo público, como os ex-ministros José Dirceu e Antonio Palocci e
até mesmo a ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney.Nos próximos
dias, a Procuradoria Geral da República deve começar a oferecer as
primeiras denúncias da Lava Jato envolvendo políticos. Com o inquérito
ainda em fase inicial, um dos principais alvos é o presidente da Câmara
dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que nega envolvimento no
esquema.
Defesas. O PT e o
PMDB negam envolvimento com o esquema e sustentam que as doações aos
partidos são legais e foram aprovadas pela Justiça Eleitoral. Odebrecht e
Andrade Gutierrez, por meio de suas defesas, refutam envolvimento com
fraudes, cartel e corrupção.