Moro vê 'risco à ordem pública' com Odebrecht em liberdade
Por Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba, Julia Affonso e Fausto Macedo
O
juiz federal Sérgio Moro avalia existência de 'risco à ordem pública'
caso o empresário Marcelo Odebrecht seja colocado em liberdade. No novo decreto de prisão do presidente da maior empreiteira do País
e de quatro executivos ligados à Odebrecht, os quais denomina
'executivos desviados', Moro aponta, ainda, 'risco à aplicação da lei
penal, notadamente em relação ao investigado Márcio Faria (um dos
executivos), seja pelo risco concreto de fuga, seja pela frustração do
sequestro e confisco de ativos'.
A
nova decisão substitui integralmente as ordens de prisões preventivas
anteriores, 15 de junho e 24 de junho, que ficam sem efeito em relação a
Marcelo Odebrecht e a quatro executivos da empreiteira, Márcio Faria,
Rogério Araújo, Alexandrino Alencar e César Rocha.
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"Presentes
riscos à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei
penal, a prisão preventiva é, infelizmente, necessária", escreveu o juiz
da Lava Jato, ao ordenar a nova prisão do grupo.
Moro observa que
"nesse contexto, em que as empresas do Grupo Odebrecht permanecem
ativas, com contratos ativos com a Petrobrás, inclusive com suspeitas de
sobrepreço, e com outras entidades do Poder Público, sem impedimento de
celebrar novos contratos com outras entidades do Poder Público, e não
tomaram qualquer providência para apurar internamente os crimes ou para
buscar acordos de leniência, é imprescindível, para prevenir a
continuidade das práticas corruptas, a prisão cautelar dos executivos
desviados.
"Ele aborda o fato de a empreiteira ter anunciado que
os executivos já foram desligados de suas funções. "Não reputo o mero
afastamento do cargo medida suficiente para prevenir tais males, pois
parte dos executivos é também acionista e, mesmo para aqueles que não
são, é na prática impossível, mesmo com o afastamento formal, controlar a
aplicação prática da medida."
O juiz da Lava Jato revela
preocupação em assegurar o emprego dos funcionários da empreiteira. "A
única alternativa eficaz à prisão cautelar dos executivos seria a
suspensão imediata dos contratos das empreiteiras com o Poder Público e a
proibição de novos contratos, mas trata-se medida substitutiva com
efeitos colaterais danosos para economia e empregos e que, portanto, não
pode ser tida como menos gravosa."
Ao abordar a questão do risco a
ordem pública, o juiz da Lava Jato aponta para o cartel de empreiteiras
que se instalou na Petrobrás entre 2004 e 2014. Ele também indica a
hipótese de os investigados intimidarem testemunhas e alertou para o
detalhe de que o esquema corrompeu políticos e dirigentes da estatal. "A
prisão cautelar é o único remédio apto a quebrar a aludida "regra do
jogo" de cartel, ajuste fraudulento de licitações e corrupção. Há risco à
investigação e à instrução. Com o patrimônio e recursos de que dispõe, a
Odebrecht tem condições de interferir de várias maneiras na colheita da
provas, seja pressionando testemunhas, seja buscando interferência
política, observando que os próprios crimes em apuração envolviam a
cooptação de agentes públicos."
"Em especial, no caso da
Odebrecht, há registro de pontuais interferências na colheita da prova
por pessoas a ela subordinadas ou ligadas", adverte o juiz, em
referência ao investidor Bernardo Freibughaus, apontado como o pagador
de propinas na Suíça da maior empreiteira do País.
"O operador por
ela (Odebrecht) contratado para o repasse da propina e lavagem de
dinheiro, Bernardo Schiller Freiburghaus, destruía as provas das
movimentações das contas no exterior tão logo efetuadas e, já no curso
das investigações, deixou o Brasil, refugiando-se no exterior, com isso,
prejudicando a investigação em relação as condutas que teria praticado
para a Odebrecht", anota Moro.
O juiz observa que a off-shore
Constructora Internacional Del Sur, que teria sido utilizada pela
Odebrecht na intermediação do repasse de propinas, foi dissolvida no
curso das investigações, em 25 de agosto de 2014. Para Moro, isso
"configura tentativa aparente de apagar os rastros que poderiam
relacioná-la à empreiteira".
O juiz pontua outro episódio que
'retrata a utilização de expedientes de intimidação pela Odebrecht
contra terceiros'. Ele se refere ao depoimento do doleiro Alberto
Youssef, réu e delator da Lava Jato. "Segundo o criminoso colaborador,
ele foi enviado como emissário pela Odebrecht, especificamente por
Márcio Faria, para prevenir dirigentes da Galvão Engenharia 'a fim de
que os mesmos parassem de furar os contratos, ou seja, oferecer preços
bastante inferiores as demais a fim de ganhar as licitações', em outras
palavras para que parassem de prejudicar o cartel."
A ameaça teria
sido confirmada por executivo da Galvão Engenharia - suposta integrante
do cartel. "O episódio evidencia a utilização pela empreiteira
(Odebrecht) de estratégias de intimidação contra quem possa lhe
prejudicar, no caso até mesmo, de forma surpreendente, outra grande
empreiteira."
No novo decreto de prisão de Marcelo Odebrecht e dos
quatro executivos, a quem o empreiteiro chama de 'meus companheiros', o
juiz da Lava Jato joga luz sobre as anotações encontradas no celular do
alvo maior da Erga Omnes, 14.º capítulo da Lava Jato. "Indicam sua
atuação direta para proteger os subordinados Márcio de Faria e Rogério
Araújo, mantendo-os dependentes da Odebrecht, para destruição de provas
(com "higienização" de aparelhos eletrônicos de Márcio de Faria e
Rogério Araújo), para divulgação de doações de campanha com aparente
objetivo de constranger políticos e obter apoio contra o Judiciário, e
para cooptação de agentes públicos ("dissidentes da PF") para interferir
nas investigações e instrução."
"O risco à investigação e à
instrução pelo emprego de métodos ilícitos é, diante dessas mensagens
descobertas supervenientemente, é evidente", afirma o juiz, que ainda
aguarda a manifestação da defesa sobre o significado das mensagens
captadas no celular de Odebrecht, antes de decidir pela instauração ou
não de inquérito específico para "apurar os aparentes atos de obstrução à
Justiça".
"Há risco à aplicação da lei penal", prossegue Sérgio
Moro. "Um dos subordinados da Odebrecht, com a função de intermediar o
pagamento de propinas, já se refugiou no exterior, no curso das
investigações, caso de Bernardo Freiburghaus. É ele nacional suíço e
dificilmente será extraditado. Há risco de que os demais, com os
recursos que dispõem, também se refugiem no exterior, colocando em risco
a aplicação da lei penal."
O juiz da Lava Jato sustenta que o
mesmo risco é concreto em relação a Márcio Faria da Silva. Após a
primeira ordem de prisão do grupo, surgiu a informação de que ele também
teria dupla nacionalidade, brasileira e suíça, e que teria enviado para
o exterior, no curso das investigações da Operação Lavajato, R$ 7,34
milhões em 13 de agosto de 2014, mais R$ 2,94 milhões em 14 de agosto de
2014, mais R$ 547,17 mil em 25 de agosto de 2014, e R$ 600,66 mil em 15
de setembro de 2014. "Isso significa que pode se refugiar com
facilidade no exterior, sem possibilidade de obtenção futura da
extradição. A remessa dos valores ao exterior no curso das investigações
também significa que frustou ou dificultou as chances de sequestro e
confisco pela Justiça brasileira, o que também coloca em risco a
aplicação da lei penal", assinala Sérgio Moro.
O juiz observa que
'embora intimada para esclarecer o fato, a defesa limitou-se a informar
que foi ela mesma que revelou as remessas ao Tribunal Regional Federal
da 4ª Região, o que demonstraria a boa-fé do investigado'.
"Entretanto,
é evidente que a revelação só foi motivada pela quebra judicial do
sigilo bancário do investigado (Marcelo Odebrecht), com o que os fatos
viriam à tona a qualquer modo. De todo modo, apesar da revelação do fato
pela defesa, não foi prestado qualquer esclarecimento sobre o motivo
das transações e a localização atual dos ativos, nem foi apresentada
qualquer iniciativa para a repatriação e a sua colocação à disposição da
Justiça brasileira."
Para Moro, essa fato também representa
"risco à aplicação da lei penal, notadamente em relação ao investigado
Márcio Faria, seja pelo risco concreto de fuga, seja pela frustração do
sequestro e confisco de ativos".
O juiz invoca decisões do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região em acórdãos do desembargador
federal João Pedro Gebran Neto, relator da Lava Jato na Corte, que
manteve as prisões de outros.
Da mesma forma, o Superior Tribunal
de Justiça, no julgamento de habeas corpus em favor de um subordinado de
Youssef, além de reiterar o entendimento da competência do juiz federal
Moro para os processos da Lava Jato, consignou, por unanimidade, a
necessidade da preventiva em vista dos riscos à ordem pública, O relator
no STJ é o ministro Newton Trisotto – desembargador estadual convocado.
Ao
negar seguimento a um habeas corpus em favor de um réu da Lava Jato,
Trisotto alertou. “Nos últimos vinte anos, nenhum fato relacionado à
corrupção e à improbidade administrativa, nem mesmo o famigerado
“mensalão”, causou tanta indignação, tanta repercussão danosa e
prejudicial ao meio social quanto estes sob investigação na Operação
Lava Jato, investigação que a cada dia revela novos escândalos.”
“Ao
princípio constitucional que garante o direito à liberdade de locomoção
se contrapõe o princípio que assegura a todos direito à segurança, do
qual decorre, como corolário lógico, a obrigação do Estado com a
‘preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio’”, assevera o juiz ao reforçar que estão presentes os
requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal. “A prisão
preventiva não viola o princípio da presunção de inocência. Poderá ser
decretada para garantia da ordem pública.”
Moro lembra que,
recentemente, em 28 de abril de 2015, o Supremo Tribunal Federal, por
maioria de votos, concedeu habeas corpus para substituir a prisão
preventiva por prisão domiciliar em favor de dirigentes de outras
empreiteiras que estavam presos preventivamente. Mas anota que a
situação, agora, é diversa. “Evidentemente, a decisão da Suprema Corte
deve ser respeitada. Entretanto, os motivos daquela decisão, centrados,
nos termos do voto do eminente relator (ministro Teori Zavascki), na
compreensão de que a prisão cautelar se estendia por período
considerável e que a instrução das ações penais estava concluída, não se
estendem automaticamente a este ou a outros casos, com situações
diferenciadas. O próprio Supremo Tribunal Federal, mesmo após aquela
decisão, já denegou a extensão da ordem e liminares em favor de outros
presos da Operação Lavajato, como o ex-diretor Renato Duque, o suposto
operador de propinas Fernando Soares |(Fernando Baiano) e também ao
ex-diretor Nestor Cerveró.”
COM A PALAVRA, A ODEBRECHT
“As defesas acabaram de tomar conhecimento e se pronunciarão oportunamente.”
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