CURITIBA - O ex-presidente Lula aumentou a presença do PMDB dentro
da Petrobras para evitar sofrer um processo de impeachment após a
revelação do escândalo do mensalão e também para proteger um de seus
filhos, Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, na investigação dos
negócios entre a Gamecorp e a Telemar.
A afirmação é do senador
cassado Delcídio Amaral em depoimento prestado à força-tarefa em
Curitiba no último dia 31 de agosto para complementar os termos de
delação premiada homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no
início deste ano. Segundo Delcídio, depois do mensalão, o presidente
Lula precisou estruturar uma base aliada mais consistente, com a
presença do PMDB, em função do desgaste gerado pela investigação da CPI
dos Correios, em 2006.
— Quando veio o mensalão, ele (Lula)
percebeu, ou ele se arruma ou poderia ser impichado — afirmou Delcídio,
em depoimento ao MPF, anexado ao processo do ex-presidente Lula,
denunciado na quarta-feira por corrupção e lavagem de dinheiro.
Delcídio
lembrou que antes do mensalão o PT governava principalmente com os
partidos que o ajudaram a ganhar a eleição. Segundo ele, o então
ministro José Dirceu chegou a negociar uma aliança para que o PMDB
participasse da base aliada, que foi inicialmente recusada por Lula.
—
Lula não topou. Ai veio o mensalão. Quando veio o mensalão o Lula fez
uma revisão das posições que ele vinha assumindo, dizendo ‘ou eu abraço o
PMDB ou eu vou morrer’. Foi então que o PMDB estabeleceu tentáculos em
toda a estrutura do governo, como o Ministério das Minas e Energia e a
Eletrobras. O setor elétrico, que era feudo do PFL, passou a ser do PMDB
— afirmou Delcídio.
ACORDO ‘TIRA E PÕE’
O
ex-senador, que presidiu a CPI dos Correios, voltou a dizer que o
relatório final incluía uma proposta de indiciamento de Lula e do filho
mais velho dele, Lulinha, e que foi feita uma composição para que as
propostas não vingassem. Segundo o político, o "tira e põe" faz parte do
dia a dia do Congresso.
— Foi feito um acordo. Os indícios e
documentos que a CPI levantou, rastreamos o dinheiro desde que ele saiu
do Banco do Brasil para as empresas do Marcos Valério (publicitário que
condenado no Mensalão) e para as contas do partido. Tinha uma operação
forte com o Marcos Valério, que era um braço armado do próprio Delúbio
(Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT) para alimentar as estruturas
partidárias. Existiam argumentos para dar continuidade a um processo de
afastamento — disse.
Segundo Delcídio, a CPI tinha indícios muito fortes e Lulinha estava numa posição inclusive mais delicada que a do próprio Lula.
O
senador cassado reafirmou que as indicações políticas para a Petrobras
sempre existiram, mas a partir do mensalão ficaram "mais escrachadas".
—
Ai as coisas escancararam mesmo, porque aí era uma máquina operando
para atender partidos importantes da base, para garantir a dita
governabilidade. As coisas ficam mais escrachadas, porque a coisa de
arrecadação da Petrobras não vem deste governo, vem de outros. Esse
governo sistematizou, colocando as diretorias a serviço dos partidos da
base, para garantir a sustentabilidade política do governo.
Delcídio
lembrou que Lula acompanhava pessoalmente não só as indicações para a
Petrobras como transformou a empresa num vetor de desenvolvimento do
país, por meio de discursos como o da importância do pré-sal, do
"petróleo é nosso", do não à privatização, do conteúdo nacional das
plataformas e sondas.
— Criaram um volume de negócios dentro da companhia que ela se tornou a grande arrecadadora do governo — explicou.
O
ex-senador afirmou que a Petrobras era um ícone na estrutura do governo
Lula e que a interlocução do presidente da estatal era direta com o
presidente da República, com ação forte de Lula no processo.
— As
vezes vejo o presidente dizer não sei de nada, nunca estive com o
diretor B ou C. Se olhar a campanha de 2006 para presidente, a discussão
foi estatização ou privatização da Petrobras, pré-sal. Todos
discutiram.
DELATOR DA LAVA-JATO
Delcídio
lembrou que Lula conversava com certa frequência com os diretores da
estatal, como mostram registros fotográficos de reuniões de Lula
discutindo projetos. Citou uma reunião de Lula, por exemplo, para
discutir projetos de refinarias com o ex-diretor de Abastecimento Paulo
Roberto Costa, que era um indicado pelo PP e um dos principais delatores
do esquema de desvios da estatal. Segundo o senador cassado, Costa já
havia indicado Costa para a TBG (Gasoduto Brasil-Bolívia) e foi alçado
diretor de Abastecimento quando Lula precisou dar mais espaço ao
partido.
Ele disse que Lula articulava, mas não agia como um executor do esquema.
—
Era o partido (PT) que executava. Como ele (Lula) conversava com os
demais partidos e tinha acompanhamento em tempo real como cada partido
estava agindo na Petrobras, ele tinha ciência clara. Ele não entrava na
execução, mas sabia o que estava acontecendo e o papel de cada diretor.
Delcídio afirmou que o próprio Lula era cobrado pelos partidos da base aliada, pelos resultados de arrecadação.
— Se o diretor não desempenhasse, a reclamação era direta lá no Palácio do Planalto. Isso sempre existiu.