Helicóptero de empreiteira foi usado para convidados de Lula
Relatório
de análise de mídia apreendida pela Operação Lava Jato na sede da
construtora Camargo Corrêa destaca e-mail de um executivo que cita
suposto pedido do chefe do cerimonial do então presidente Luiz Inácio
Lula da Silva para providenciar helicóptero a um grupo de seis
convidados do petista para uma visita à Usina Hidrelétrica Jirau, no Rio
Madeira, em Rondônia.
A correspondência, de 9 de março de 2009,
foi enviada às 22h53 por Antonio Carlos Portugal a outros seis
executivos da Camargo Corrêa, que está sob suspeita de ter integrado
cartel de empreiteiras no esquema de corrupção na Petrobras.
No
início de junho, a Polícia Federal juntou aos autos da investigação
laudo pericial que indica pagamento da empreiteira no valor de R$ 3
milhões para o Instituto Lula e mais R$ 1,5 milhão para a LILS Palestras
Eventos e Publicidade, de Luiz Inácio Lula da Silva, entre os anos de
2011 e 2013.
Foram três pagamentos de R$ 1 milhão cada registrados
como "Contribuições e Doações" e "Bônus Eleitoral" para o Instituto,
aberto por Lula após ele deixar a Presidência da República, em 2011.
O
e-mail agora juntado pela PF aos autos da investigação foi interceptado
na Camargo Corrêa em novembro, quando deflagrada a Operação Juízo
Final, sétima fase da Lava Jato. Nele, o executivo Antonio Carlos
Portugal diz a seus interlocutores que o então chefe do cerimonial de
Lula o procurou para que resolvesse 'um problema' com os convidados do
petista.
A lista dos convidados de Lula consta da mensagem, entre
eles três senadores, um assessor especial 'da ministra Dilma Rousseff'
(ela ocupava o Ministério de Minas e Energia), o então presidente do
Sesi e o diretor-geral do Senai.
A mensagem foi encaminhada a
outros seis altos executivos da empreiteira: Kalil Cury Filho, Luiz
Roberto Ortiz Nascimento, Vitor Hallack, Antônio Miguel Marques, João
Ricardo Auler e Francisco de Assis Oliveira Azevedo.
O 'problema',
segundo Portugal, é que a capacidade do helicóptero oficial da
Presidência estava completa. O chefe do cerimonial de Lula, segundo
Portugal, solicitou que um helicóptero da empreiteira fosse colocado à
disposição do Palácio do Planalto e que deveria estar no aeroporto de
Porto Velho (RO) na chegada do avião presidencial para acompanhar o
comboio oficial.
Ainda segundo o executivo, o ministro pediu à
empreiteira que ajudasse a 'conduzir os seis convidados nos trajetos
Porto Velho - Jirau e Jirau - Santo Antônio". Por outro lado deveria ser
contactado o oficial da Aeronáutica que está no Escalão Avançado da
Presidência para acertar os detalhes de pouso e decolagem desse aparelho
para incorporar-se ao comboio aéreo oficial."
No pé do e-mail,
Portugal escreveu: "Relação dos convidados do Pres. Lula: - Senador
Valdir Raupp (PMDB/RO), Senadora Fátima Cleide (PT/RO), Senador Expedito
Júnior (PR/RO), Sr. Anderson Dornelles, Assessor Especial da Ministra
Dilma Rousseff; Sr. Jair Meneghelli, Presidente do SESI, Sr. José Manuel
Martins, Diretor-Geral do SENAI." - Fátima Cleide (PT) e Expedito
Júnior (PSDB) não exercem mais mandato no Senado.
Energia
O
setor de energia é a próxima área de interesse das investigações da
Lava Jato, fora dos contratos da Petrobras, que até aqui revelaram
desvios de até R$ 19 bilhões, segundo a Polícia Federal. Dois executivos
da Camargo Corrêa, Dalton Avancini e Eduardo Leite, confessaram em
delação que a empreiteira pagou propina na obra da Usina Hidrelétrica de
Belo Monte, ainda em construção.
A Camargo Corrêa integrou o
Consórcio Energia Sustentável do Brasil, vencedor do leilão de Jirau, em
2008. A um custo de R$ 10 bilhões, a usina localizada no Rio Madeira
entrou em operação em 2013, mas as obras seguiram. O grupo acabou
deixando o consórcio, posteriormente.
A visita de Lula a Jirau
ocorreu, de fato, três dias depois. Em discurso, o então presidente
citou os nomes de pelo menos três políticos de Rondônia incluídos na
lista mencionada pelo executivo da Camargo Corrêa. "Deixa eu dizer duas
coisas para vocês: eu dizia ao Governador, dizia ao Prefeito, e vinha
discutindo no avião com o senador Expedito, com a Fátima Cleide e com o
Raupp. Ou seja, eu vinha discutindo o seguinte: Eu quero ver como é que
estará o Estado de Rondônia daqui a 15 anos."
Lula disse que o
investimento na usina alcançou R$ 10 bilhões e citou outro nome da lista
de seus supostos convidados, Jair Meneguelli. "É uma coisa
extraordinária, que eu nem sabia, que aconteceu aqui, agora, que eu
quero valorizar muito: o acordo feito pelo Sebrae e pelas empresas para
formar aqui 100 microempresários, prepará-los para que eles possam
ajudar a dinamizar os investimentos e os empreendimentos aqui no estado
de Rondônia. E, sobretudo, o acordo feito pelo Meneguelli, em nome do
Sesi, com os empresários também, para a formação de 10 mil trabalhadores
aqui, no estado de Rondônia."
"A então ministra-chefe da Casa
Civil, Dilma Rousseff, acompanhou o então presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, em visita oficial aos canteiros de obras de Santo Antônio e
Jirau. Integraram a comitiva Marcos Raposo, servidor de carreira do
Itamaraty, atualmente embaixador do Brasil em Lima, e o servidor
Anderson Dornelles, hoje assessor especial da Presidenta da República,
que não fez uso do helicóptero da companhia. Nenhuma norma legal foi
infringida pelos referidos servidores, conforme o Código de Conduta da
Administração Federal."
Outro lado
O
presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência, Américo Lacombe,
informou que na próxima segunda-feira, 13, irá analisar se houve alguma
irregularidade no episódio. "Vamos analisar diante dos fatos concretos
que forem fornecidos. Depende dos fatos. Julgamos fatos, não julgamos
hipóteses."
Preliminarmente, Lacombe avalia que não houve
irregularidade se, de fato, foi usado um helicóptero da Camargo Corrêa
para levar convidados do então presidente Lula. "Ao que parece a
licitação (das obras de Jirau) já tinha ocorrido, a empresa já havia
ganho a concorrência."
Para o presidente da Comissão de Ética se
houve a cessão do helicóptero ela ocorreu após o processo de licitação,
portanto, a empreiteira não buscava favorecimento.
"Irregularidade
ocorreria se fosse uma visita antes da licitação a uma área no
helicóptero de um dos concorrentes", anotou Américo Lacombe. "Mas vamos
verificar esse episódio na semana que vem, reitero, com base em fatos,
não em hipóteses."
O Instituto Lula informou que o então
presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi transportado no helicóptero da
Presidência e fez um sobrevoo das obras (de Jirau). A atividade constou
da agenda oficial, foi acompanhada pela imprensa e divulgada.
A viagem, destacou o Instituto, foi para o lançamento da pedra fundamental da construção da usina de Jirau.
O Instituto informou que desconhece tanto o pedido quanto se o helicóptero foi disponibilizado.
Sobre
indagação se é normal o fato de o então chefe do cerimonial de Lula ter
solicitado um meio de transporte para seis pessoas que teriam sido
convidadas do presidente, o Instituto Lula sugeriu que a pergunta fosse
encaminhada ao próprio chefe do cerimonial na época.
Em junho,
quando a Polícia Federal juntou aos autos da Lava Jato um laudo que
apontava repasses da Camargo Corrêa, o Instituto Lula, por meio de sua
assessoria de imprensa, observou que os valores registrados na
contabilidade da empreiteira foram doados legalmente e não existe
relação entre a entidade e questões eleitorais.
Segundo a
assessoria, "os valores citados foram doados para o Instituto Lula para a
manutenção e desenvolvimentos de atividades institucionais, conforme
objeto social do seu estatuto, que estabelece, entre outras finalidades,
o estudo e compartilhamento de políticas públicas dedicadas à
erradicação da pobreza e da fome no mundo".
Quanto aos valores
para a empresa de eventos de Lula a assessoria informou que "os três
pagamentos para a LILS são referentes a quatro palestras feitas pelo
ex-presidente, todas elas eventos públicos e com seus respectivos
contratos".
"Essas doações e pagamentos foram devidamente contabilizados, declarados e recolhidos os impostos devidos."
A
nota informa ainda que "as doações ao Instituto Lula e as palestras do
ex-presidente não têm nenhuma relação com contratos da Petrobras".
Ainda
nessa ocasião, a Construtora Camargo Corrêa esclareceu que 'as
contribuições ao Instituto Lula referem-se a apoio institucional e ao
patrocínio de palestras do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no
exterior'.
Por sua Assessoria de Imprensa, a Construtora Camargo
Corrêa declarou: "Quanto a solicitação, a Construtora Camargo Corrêa não
teve prazo para confirmar a operação, mas esclarece que prestar o apoio
necessário é comum para deslocamentos em região de difícil acesso."
O
senador Valdir Raupp (RO),vice presidente nacional do PMDB, disse que
não se recorda de ter viajado em helicóptero da Camargo Corrêa. "Como é
que vou saber que cor é a vaca que eu tomo o leite?", questionou. "Eu me
lembro que uma vez viajei em uma empresa de táxi aéreo, posei na pista
de Jirau, mas em helicóptero eu não lembro.
Os ex-senadores Fátima
Cleide (PT/RO) e Expedito Júnior (PSDB/RO), ambos de Rondônia, não
foram localizados. A reportagem também não conseguiu contato com Jair
Meneghelli e José Manuel Martins. Com informações do Estadão Conteúdo.
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