O advogado-geral da União (AGU)
José Eduardo Cardozo voltou a afirmar nesta sexta-feira que o processo
de impeachment da presidente Dilma Rousseff, nos moldes discutidos pelo
Congresso, é um "golpe de Estado" porque as pedaladas fiscais praticadas
no Plano Safra 2015 não seriam ilegais no momento em que foram
praticadas e porque os decretos de suplementação orçamentária não
acarretaram em maior despesa para os cofres públicos. Os dois temas - as
pedaladas no programa de subsídio agrícola e a liberação de bilhões de
reais sem autorização de congressistas - são os pontos-base do processo
que pode levar ao afastamento antecipado da petista do governo.
Em
sua argumentação, Cardozo disse que o pedido de impedimento da
presidente não poderia sequer estar sendo discutido porque o processo
começou "viciado" a partir de uma "vingança" do presidente da Câmara
Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Ele ainda afirmou que um procedimento tão
incisivo como o impeachment poderia ser levado a cabo apenas depois de o
Congresso analisar em definitivo as contas da presidente da República
de 2015. O Ministério Público de Contas (MPC) confirmou a prática das
pedaladas fiscais também no primeiro semestre de 2015. Essas manobras,
que levaram o TCU a dar parecer pela reprovação das contas do governo em
2014, consistem em atrasar repasses do Tesouro aos bancos públicos para
que eles paguem despesas de programas obrigatórios. O tribunal entende
que, ao fazer esses pagamentos com recursos próprios, as instituições
concedem empréstimos irregulares ao governo, seu ente controlador, o que
é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Na
hipótese de o Congresso aprovar as contas do governo referentes a 2015,
Cardozo criticou os prováveis efeitos de um impeachment já consolidado
contra a presidente. "Como faz? É incompreensível. Essa precipitação e
açodamento de fazer o impeachment antes do julgamento das contas é
evidente caracterizador de um desejo puramente político do afastamento
da presidente, o que é inaceitável no presidencialismo. É próprio do
parlamentarismo, mas inaceitável no presidencialismo", disse.
Ao
longo de sua exposição, o advogado-geral da União anunciou que pedirá
ainda nesta sexta-feira a suspeição do relator do processo de
impeachment na comissão especial, o tucano Antonio Anastasia (PSDB-MG). A
argumentação do AGU leva em conta o fato de um dos subscritores do
impeachment, o jurista Miguel Reale Jr., ser filiado ao PSDB e pela
outra autora do processo, a professora Janaína Paschoal, ter sido
contratada para elaborar um parecer para o partido sobre o impeachment.
Na
comissão especial do impeachment no Senado, o ministro Cardozo também
utilizou entendimentos da Corte Interamericana de Direitos Humanos para
questionar a legitimidade da votação do impeachment na Câmara e
argumentar que, na apreciação do caso pelos deputados, não poderia ter
havido orientação de voto nem declaração prévia de como cada parlamentar
pretendia se manifestar. "Se perde o mínimo de objetividade e
imparcialidade. Se fosse um processo político, não haveria problema. Mas
é um processo político-jurídico e aí não pode. Partidos fecharam
posição política no impeachment. Isso claramente maculou o processo. O
voto do parlamentar é de consciência. Não pode ter fechamento de questão
e nem orientação partidária. Houve dos dois lados mas não poderia ter
ocorrido. Isso vicia esse julgamento", disse.
A
exemplo dos ministros Nelson Barbosa (Fazenda) e Kátia Abreu
(Agricultura), José Eduardo Cardozo também defendeu a legalidade dos
decretos de crédito suplementar e a falta de ilícito no atraso de
pagamentos ao Banco do Brasil no Plano Safra 2015 - os dois pontos que
embasam a denúncia por crime de responsabilidade contra Dilma. "Não há
nenhuma ilegalidade na expedição desses decretos. Esses decretos não vêm
da cabeça da presidente. Alguns vieram do Poder Judiciário, do Tribunal
Superior Eleitoral, da Justiça do trabalho, que pediram [complementação
orçamentária]. Será que estarão acumpliciados com a perspectiva de
descumprimento da meta fiscal? Não", disse. "Os senhores sabem como as
coisas funcionam. Isso é gestão. Não vem da cabeça do presidente, vem
dos órgãos, alguns até do poder judiciário", afirmou.
Sobre
as pedaladas fiscais no Plano Safra, disse que "não há ilícito" nem
operação de crédito. "É um contrato de prestação de serviços em que se
atrasam pagamentos. Não há dolo, não há ato, não há ilícito. Não se pode
praticar ao arrepio da Constituição Federal o afastamento de uma
presidente legitimamente eleita. Não é um impeachment realizado dentro
da ordem democrática. É um golpe de Estado", acusou o AGU.
Nenhum comentário:
Postar um comentário