BRASÍLIA - Tratado
pelo Palácio do Planalto como peça-chave para impedir o agravamento da
crise política, que pode culminar até no impeachment da presidente Dilma
Rousseff, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tem
sinalizado a interlocutores diretos que pode voltar a colaborar com o
governo da petista a partir desta semana, na volta do recesso
parlamentar. Renan, contudo, cobrará "faturas" nas áreas política e
econômica, em troca da ajuda.
Há duas semanas, logo após o
anúncio do rompimento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o
governo decidiu reforçar uma operação envolvendo ministros como Joaquim
Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) e lideranças políticas
petistas para cortejar o presidente do Senado. "Renan será o fiel da
balança", definiu um dos envolvidos na investida do governo.
A presidente Dilma
Dida Sampaio/Estadão
O Palácio do Planalto quer retomar a relação que
mantinha com Renan durante o primeiro mandato Dilma, quando ele foi o
principal interlocutor do governo no Congresso. O peemedebista, que
contou com o apoio da presidente para se reeleger presidente do Senado
em fevereiro, afastou-se do Planalto no mês seguinte, na esteira da
abertura de três inquéritos contra ele no âmbito da Operação Lava Jato.
Nos bastidores, Renan acusa o governo de ter atuado para incluí-lo no
rol dos investigados.
O Planalto, porém, aposta no presidente do
Senado para neutralizar os efeitos de uma provável decisão desfavorável
no julgamento das contas de 2014 da gestão Dilma pelo Tribunal de Contas
da União (TCU). Caberá à Casa presidida por Renan apreciar inicialmente
o parecer analisado pela corte.
Se tanto o Senado quanto a Câmara
reprovarem as contas do governo, esse seria o primeiro passo para que
um processo de impeachment fosse aberto contra a presidente. Por isso,
dizem aliados, com a Câmara liderada pelo oposicionista Cunha, Renan é
tido como fundamental para barrar no nascedouro um movimento pelo
impedimento da presidente.
O peemedebista, porém, ainda não
decidiu que papel vai adotar. É a esse delicado cálculo político que ele
tem se dedicado nos últimos dias. Apesar da disposição de voltar a
ajudar o governo, Renan deve investir na tese de que a análise das
contas de 2014 poderá ser feita antes das contas de anos anteriores -
ainda pendentes de julgamento - serem apreciadas pelo Congresso. Não há
nada no regimento do Congresso que impeça isso e trata-se de uma decisão
política.
Conta. Para aliados do presidente do
Senado ouvidos pelo Estado, contudo, Renan está inclinado a assumir o
papel de fiador da governabilidade de Dilma.
Mas vai impor
condições. Segundo interlocutores, uma das principais faturas do
peemedebista seria que Dilma promovesse mudanças no seu núcleo duro de
governo, a começar pelo ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio
Mercadante. O nome que conta com a simpatia de Renan é o do ministro da
Defesa, Jaques Wagner, considerado por ele um político habilidoso. Desde
a época em que eram colegas de Senado, Renan e Mercadante nunca tiveram
uma boa relação e o peemedebista não está disposto a voltar a conversar
com o Planalto se tiver o atual ministro como interlocutor.
Em
outra frente, o presidente do Senado aguarda um apoio financeiro maior
do governo federal a seu filho e herdeiro político, o governador de
Alagoas, Renan Filho (PMDB) - que comanda um Estado com graves
dificuldades econômicas. A expectativa no ano passado, quando Renan
Filho foi eleito, era de que ele teria total apoio de Brasília para
tirar de Alagoas o título de campeão em recordes negativos em
indicadores sociais.
Ajuste. Renan também quer
ter maior participação nas decisões do governo, principalmente em
relação à política econômica. O fato de Levy ter consultado o senador
antes do anúncio da redução da meta do superávit, há cerca de dez dias,
agradou o peemedebista. Crítico do ajuste fiscal elaborado pela equipe
econômica, que recentemente classificou como “tacanho”, ele defende
ainda que o governo corte despesas do próprio Executivo, a começar pela
redução do número de ministérios.
Assim como na crise de 2007, em
que contou com o apoio do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o
peemedebista espera solidariedade do governo caso sua situação na Lava
Jato venha a se complicar.
O assunto tem preocupado o Planalto,
que avalia que a 16ª fase da operação, deflagrada na semana passada e
que avança sobre as irregularidades do setor elétrico, pode afetar
diretamente o grupo ligado a Renan na Casa e, assim, dificultar ainda
mais a reaproximação.
Peemedebista espera para avaliar a 'pressão das ruas'
A
disposição do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de
ajudar o governo da presidente Dilma Rousseff vai depender também
principalmente da pressão que vier das ruas.
Para avaliar qual
caminho vai seguir, o peemedebista tem, inclusive, encomendado pesquisas
para ver se os eleitores o relacionam como um nome ligado à petista.
Segundo auxiliares do presidente do Senado, os resultados das pesquisas
encomendadas por Renan mostram um descolamento da imagem dele e da
petista, o que facilitaria a construção de um discurso caso ele decida
romper publicamente com o governo.
O peemedebista tem dito a
interlocutores que está aberto a uma reaproximação com o governo, mas
isso pode mudar caso as manifestações que pedem o impeachment da
presidente ganhem força. Os próximos protestos estão marcados para o
próximo dia 16.
Renan deixou engatilhado o discurso de que o
governo tomou um rumo, principalmente na crise econômica, com o qual não
concorda. Por isso, estaria livre para desembarcar da base aliada.
Para lembrar: O 'camaleão político'
Com
mais de 36 anos de carreira pública, desde que se elegeu pela primeira
vez deputado estadual por Alagoas pelo antigo MDB, o atual presidente do
Senado, Renan Calheiros (PMDB), completa 60 anos no dia 15 de setembro,
tendo passado por sobressaltos em sucessivos governos. É um “camaleão
político”, na definição de um aliado.
No governo Sarney, Renan foi
um dos artífices da candidatura de Fernando Collor (foto) à Presidência
e, depois, integrante da tropa de choque do governo dele no Congresso.
Rompeu com Collor posteriormente e contribuiu para sua queda ao acusá-lo
de ter conhecimento do esquema PC Farias.
Em dezembro de 1989, Collor recebe o deputado Renan Calheiros em seu comitê de campanha, em Brasília
José Paulo Lacerda/Estadão
No governo Itamar, foi vice-presidente executivo
da Petrobrás Química (Petroquisa) e, em 1994, elegeu-se senador pela
primeira vez. Quatro anos depois, se licenciou do cargo para se tornar
ministro da Justiça do governo do tucano Fernando Henrique Cardoso.
Mesmo
tendo apoiado a candidatura de José Serra em 2002 (o único Estado em
que o tucano venceu foi Alagoas), foi um dos primeiros peemedebistas do
Senado a apoiar o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano
seguinte, logo após emplacar seu apadrinhado Sérgio Machado na
Transpetro (que perdeu o cargo por envolvimento na Lava Jato).
Em
2011, já no governo Dilma, como líder do PMDB, foi um dos principais
fiadores da governabilidade. Foi relator da Medida Provisória 579,
batizada de MP do Setor Elétrico. Em fevereiro deste ano, ganhou pela
quarta vez a disputa pela Presidência da Casa na votação mais acirrada
que disputou. No mês seguinte, tornou-se alvo de três inquéritos da
Operação Lava Jato e, de aliado irrestrito, se distanciou do governo.
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