São Paulo – “Não esmoreço. Olho
para trás e vejo tudo o que fizemos. Olho para frente e vejo tudo o que
precisamos e podemos fazer”. Foi com essas palavras que, há um mês, a presidente afastada Dilma Rousseff (PT) se despediu do exercício de seu mandato.
Nos
últimos 30 dias, a petista cumpriu o papel (ao menos diante das
câmeras) de quem não desiste fácil: povoou as redes sociais com críticas
à atual gestão, viajou pelo país para engrossar o coro dos que gritam
“fora, Temer” e declarou apoio até à convocação de um plebiscito para consultar a população sobre a possibilidade de novas eleições ainda neste ano.
No
entanto, segundo especialistas sondados por EXAME.com, essa estratégia
não será suficiente para reverter o placar hoje desfavorável a ela no
Senado Federal.
Há um mês, 55 senadores votaram pela abertura do julgamento de impeachment contra a petista e seu consequente afastamento.
Em outros termos, se nenhum senador mudar seu voto,
a Casa já teria o necessário para impedir o mandato da presidente
afastada. Vale lembrar: para que o processo seja levado a cabo, é
necessário que 2/3 (54 votos) dos senadores o aprovem.
O
Senado que irá votar o impeachment, provavelmente, no início de agosto
será sutilmente diferente daquele que afastou Dilma em maio.
Ao
menos cinco parlamentares que não estavam presentes há um mês devem
acompanhar a votação: dois deles são suplentes de hoje ministros de
Michel Temer (PMDB), um substitui o senador cassado Delcídio do Amaral e
os outros dois faltaram na primeira votação, garantindo por tabela mais
dois votos favoráveis à presidente. Desse grupo, a projeção da
Prospectiva é de que apenas um vote contra o fim do mandato da petista.
Há
ainda cinco senadores que apoiaram a abertura do processo, mas que
ainda se declaram indecisos sobre seu voto final. Se todos os membros
desse grupo realmente mudarem seu voto, Dilma Rousseff ganha uma chance
de virar o jogo. Mas, para os analistas consultados por EXAME.com, essa
possibilidade é baixa.
Na balança
A
razão para isso está centrada em um dos principais fatores que colocou o
mandato de Dilma Rousseff em xeque. Mais do que o clamor das ruas ou o
avanço da operação Lava Jato,
o que reduziu as chances da petista de se manter no poder foi sua
inabilidade política para costurar acordos e manter a própria base.
“A
explosão do governo foram os fatores externos, mas a implosão foi a
falta de diálogo”, afirma Thiago Aragão, diretor de estratégia da Arko
Advice. “Foi um governo inábil sem a menor noção de como se faz política
dentro de um ambiente econômico deteriorado”.
Dito
de maneira mais clara, o placar do impeachment só se altera no Senado
se os parlamentares concluírem que era melhor negociar com a gestão
anterior do que com a atual, nas palavras de Aragão. Cenário que até
agora o governo Temer fez questão de combater.
Uma prova disso é a maneira como o peemedebista costurou sua equipe ministerial e consequente base de apoio.
Estudo
da Pulso Público revela que, ao lado da equipe do governo de Fernando
Henrique Cardoso (PSDB), a equipe do peemedebista é a mais equilibrada
em termos partidários e a mais coerente com o Congresso desde a
redemocratização.
A
consultoria chegou a essa conclusão após calcular a taxa de coalescência
do gabinete de Temer. Tal indicador mede a proporção entre a
importância dos partidos da base aliada no Congresso e a quantidade de
ministérios recebidos por cada legenda. Ele vai de 0 a 1. Quanto mais
próximo de 1, mais proporcional é a repartição do poder entre as siglas
da coalizão.
No caso do
governo Temer, a taxa de coalescência está em 0,805. Durante o segundo
mandato da presidente afastada Dilma Rousseff (PT), não passou de 0,714 –
o pior desempenho nesse quesito desde o governo Collor.
“Para
estar a favor do impeachment não precisa amar o governo Temer. Os
senadores não comparam apenas Dilma com Temer. Eles comparam [Eliseu]
Padilha com [Aloisio] Mercadante, [Henrique] Meirelles com [Nelson]
Barbosa”, diz Aragão. “Eles falam: por mais insatisfeitos que a gente
possa estar, pelo menos ligamos o telefone e falamos direto com o
Padilha. Antigamente, falávamos com as paredes”.
Uma questão de tempo
Apesar de amargar uma avaliação positiva tão baixa quanto a de Dilma frente a opinião pública, segundo pesquisa CNT/MDA divulgada na última semana, o governo Temer experimenta ainda de uma margem de manobra diante de uma parcela significativa da população.
De
cada 10 entrevistados, três preferiram não opinar sobre a gestão do
peemedebista durante a sondagem da CNT/MDA. Para Marcelo Issa,
sócio-diretor da Pulso Público, esse grupo estaria aguardando um pouco
mais para avaliar a atuação do chefe provisório do Executivo.
É
por essa razão que, em certa medida, o tempo corre contra o presidente
em exercício – tanto por andar rápido demais quanto por demorar para
passar.
Explica-se: os 150
dias máximos que restam para o Senado dar um desfecho para o impeachment
não são suficientes para que Temer colha resultados vibrantes na
economia, mas são longos o bastante para que novas revelações e
imprevistos desgastem a imagem do governo diante da opinião pública –
entre elas, uma possível prisão de Eduardo Cunha (PMDB) que ainda mantém um certo poder de influência nos corredores do Palácio do Planalto e Congresso.
Não
por acaso, aliados do PMDB na comissão de impeachment fizeram de tudo
para apressar o ritmo do julgamento. Mas a manobra acabou derrotada no
colegiado, para alegria dos petistas. A votação final deve acontecer só
no início de agosto.
A última cartada
A julgar pelo teor da entrevista que Dilma Rousseff concedeu à rede EBC, a expectativa é de que o governo afastado esteja disposto a dar sua última cartada para voltar ao poder.
“O
pacto que vinha desde a Constituição de 1988 foi rompido e não acredito
que se recomponha esse pacto dentro de gabinete. Acredito que a
população seja consultada”, disse a presidente afastada em referência à
convocação de um plebiscito propondo novas eleições.
Para
Marcelo Issa, da Pulso Público, a repercussão dessa proposta pode
complicar a situação do peemedebista. “A vida de Temer não está nada
fácil. Serão pelo menos dois meses de sangria no governo com a
possibilidade de ver uma boa parcela da opinião pública engajada nesse
compromisso de consulta popular para novas eleições”, diz.
Mas
há um problema na estratégia da petista. Para que saia do campo das
ideias, tal proposta demanda empenho do Congresso. Sugerir isso sem ter
um acordo com os parlamentares pode ser mais um tiro no pé na biografia
política de Dilma Rousseff.
“Ela
repete um erro na medida em que joga para o Congresso Nacional uma
pauta onerosa sem negociar. Ela não pode simplesmente contornar o
Congresso, como se ele não existisse ou não importasse”, afirma Thiago
Vidal, coordenador de análise política da Prospectiva.
Dada
a coleção de reviravoltas que marcaram todo o processo que levou ao
afastamento da presidente Dilma Rousseff, os 50 dias que provavelmente
restam para o fim do julgamento do impeachment podem ser o bastante para
que o provável e o improvável aconteça. Até lá, como diz Aragão, da
Arko Advice, é insustentável esboçar qualquer previsão com 0% ou 100% de
certeza. Aguardemos.
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