O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quarta-feira por
transformar o atual presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), em réu na Operação Lava Jato. Os magistrados não atenderam a
todos os pedidos do Ministério Público, que compareceu em massa à sessão
plenária que analisa o caso Cunha, e circunscreveu as suspeitas apenas a
fatos mais recentes.
Segundo
o que o MP chamou de "propinolândia", entre junho de 2006 e outubro de
2012, Cunha pediu e aceitou propina de cerca de 15 milhões de dólares do
lobista Julio Camargo por conta da contratação do navio-sonda Petrobras
10000 com o estaleiro Samsung heavy Industries. Também estavam
envolvidos na transação, entre outros o operador Fernando Baiano e o
ex-diretor de Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró, que, como
dirigente da petroleira, corroborou a transação fraudulenta. Entre
fevereiro de 2007 e outubro de 2012, o MP elencou novas evidências de
que o peemedebista, segundo na linha sucessória da presidente Dilma
Rousseff, teria embolsado dinheiro sujo.
Para
o relator, no entanto, não há indícios suficientes da participação de
Eduardo Cunha em todos os episódios. Isso porque o lobista Fernando
Baiano disse, em delação premiada, que conheceu o dpeutado apenas em
2009, o que fragiliza, portanto, a tese da acusação de que o
peemedebista tenha recebido propinas desde 2006, época de celebração dos
contratos envolvendo navios-sonda. Teori Zavascki pontuou que existem
"elementos mais do que suficientes" de repasse de dinheiro sujo ao
ex-diretor Nestor Cerveró no afretamento dos navios Petrobras 10000 e
Vitoria 10000, mas afirmou que, pelo menos nos anos de 2006 e 2007,
quando foram celebrados os contratos de navios-sonda com a Samsung Heavy
Industries, não há indício de participação do atual presidente da
Câmara dos Deputados.
"Há
indícios robustos para receber parcialmente a denúncia, cuja narrativa,
ademais de reforçado pelo aditamento, dá conta de que Eduardo Cunha
procurou por Fernando Soares, aderiu ao recebimento de vantagem indevida
oriunda de propina destinada a diretor da Petrobras", disse o relator.
"Os elementos colhidos comportam sobejamente o possível cometimento de
crime de corrupção passiva majorado, com aumento na qualidade de
partícipe por parte do deputado Eduardo Cunha, ao incorporar-se na
engrenagem espúria do ex-diretor Nestor Cerveró", completou ele.
"Quanto
à participação na celebração dos contratos, houve uma cerca alusão
inicial por parte de depoimentos de delação, mas nada disso foi
confirmado. Os próprios colaboradores se encarregaram de afastar essa
hipótese. O que restou e não deixa de ser grave é a participação nesse
segundo momento", disse Zavascki. Os ministros Cármen Lúcia, Marco
Aurélio, Edson Fachin e Rosa Weber seguiram o voto do relator contra
Eduardo Cunha, formando maioria cem desfavor do congressista. O
julgamento vai continuar nesta quinta-feira, quando os demais
magistrados vão proferir seus votos.
De
acordo com relato do MP, no entanto, o deputado aceitou propina de mais
25 milhões de dólares para o afretamento de outro navio-sonda, o
Vitoria 10000, contratado também em junto à Samsung Heavy Industries.
"Nos dois navios-sonda, Eduardo Cunha era o sócio-oculto de Fernando
Soares e também foi o destinatário final da propina paga, tendo
efetivamente recebido ao menos cinco milhões de dólares", disse o
procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Os contratos dos
navios-sonda Petrobras 10000 e Vitoria 10000 custaram, respectivamente,
586 milhões de dólares e 616 milhões de dólares. "Houve irregularidades
na contratação ilícita desses dois navios-sonda no âmbito da Diretoria
Internacional. O valor dos contratos supera 1 bilhão de dólares, o que
supera e muito o orçamento anual do Ministério Público da União",
afirmou Janot.
Na primeira
leva da propina, diz a acusação, o pagamento a Eduardo Cunha foi para
garantir a manutenção do esquema de corrupção. Em um segundo momento, o
recebimento de 5 milhões de dólares foi para pressionar o retorno do
pagamento de propinas ao peemedebista.
Na
transação para que o propinoduto de Eduardo Cunha estivesse sempre
abastecido, a correligionária do peemedebista, Solange Almeida
(PMDB-RJ), atual prefeita de Rio Bonito (RJ), passou a apresentar, na
Câmara dos Deputados, requerimentos com pedidos de informação sobre os
dois contratos da Samsung Heavy Industries, perante a Comissão de
Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, como forma de pressionar o
lobista Julio Camargo. Nos documentos datados de 2011, por exemplo,
Solange Almeida, aliada de Cunha, solicitou ao Tribunal de Contas da
União (TCU) e ao então ministro de Minas e Energia, Edison Lobão
(PMDB-MA) dados de contratos, auditorias, aditivos e licitações que
envolviam "o Grupo Mitsui com a Petrobras ou qualquer das suas
subsidiárias no Brasil ou no exterior". Os requerimentos comprovam, na
avaliação do Ministério Público, que aliados de Cunha fizeram pressão
política sobre a Mitsui e o lobista Julio Camargo depois de supostos
atrasos no pagamento de propina. Camargo era representante do Grupo
Mitsui.
Em outubro do ano
passado, o procurador-geral fez uma complementação da denúncia e
acrescentou trechos do depoimento em que o lobista Fernando Baiano, que
se tornou delator da Operação Lava Jato, confirma que Eduardo Cunha
recebeu pelo menos 5 milhões de dólares nos dois contratos de
navios-sonda.
Defesa -
Ex-procurador-geral da República, o advogado Antonio Fernando de Souza
questionou supostas omissões do Ministério Público ao descrever a
atuação de Cunha. Ele disse, por exemplo, que o lobista Fernando Baiano
só conheceu o deputado em 2009 e, portanto, não poderia ter atuado em
favor do parlamentar desde 2006, quando o primeiro episódio de propina
ocorreu. Souza ainda tentou desqualificar a influência de Eduardo Cunha
sobre o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró e disse que os delatores
da Lava Jato Julio Camargo e Fernando Baiano "inventaram" acusações
contra o peemedebista. "Não ajustou nada com ninguém. O ajuste está dito
entre Cerveró, Fernando e Julio", sustentou.
Auditoria
encaminhada ao Ministério Público em maio do ano passado aponta uma
série de irregularidades cometidas na compra de navios-sonda pela
Petrobras e indica que o então diretor da Área Internacional Nestor
Cerveró atuou diretamente para fechar os dois contratos dos
navios-sonda, considerados desnecessários à empresa e que, ao final,
tiveram preços superestimados sem explicação.
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