O impacto da lama que desceu o
Rio Doce e chegou ao mar do norte do Espírito Santo é "muito expressivo"
e precisa continuar a ser monitorado "em tempo real". Essa é prioridade
no momento, segundo a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que
fez um sobrevoo da foz do rio na tarde desta segunda-feira, 23, no
município de Linhares, com o governador capixaba Paulo Hartung (PMDB).
Ela determinou que esse monitoramento continue a ser feito pelas
agências do governo por pelo menos mais 90 a 120 dias.
"O
acidente não acabou", repetiu a ministra. Ela lembrou que muita lama
está retida rio acima, e que a temporada de chuvas está apenas
começando, o que significa que muitos sedimentos ainda vão escoar para o
mar. "Só quando terminar o período de chuvas eu poderei ter uma
avaliação concreta do fim do acidente e das medidas efetivas que
precisam ser tomadas, além das emergenciais, para a restauração do Rio
Doce."
Em Minas Gerais, próximo ao epicentro do desastre,
projeções iniciais baseadas em imagens de satélite indicam que mais de
900 hectares de terra foram diretamente impactos pela enxurrada de lama
causada pelo rompimentos das barragens da mineradora Samarco (que
pertence às gigantes Vale e BHP) em Mariana, no dia 5 de novembro. O
desastre deixou 8 mortos já identificados e ainda há 11 pessoas
desaparecidas.
"A emergência ainda está em curso", reforçou
Hartung. Outra prioridade indicada pelas autoridades foi a de aumentar
os esforços de levar informações sobre o acidente às populações
ribeirinhas, especialmente relacionadas à qualidade da água - que,
segundo as análises iniciais, não é tóxica. "Tem muita gente afobada,
muito desencontro de informações", disse a ministra. "As pessoas estão
nervosas, estão inquietas estão abaladas; e têm que estar abaladas
mesmo, porque o acidente é grave."
A onda de lama percorreu quase
que toda a extensão do Rio Doce até chegar ao mar, formando uma grande
mancha de água marrom no oceano. A previsão feita por pesquisadores da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ) na semana passada
era de que a mancha de lama mais grossa impactaria uma área de 9
quilômetros de costa - incluindo parte da Reserva Biológica de Comboios,
que protege uma praia usada para desova de tartarugas marinhas
ameaçadas de extinção.
"Infelizmente não há nada
mais que se possa fazer aqui para impedir a lama de chegar no mar",
disse ao Estado o chefe da reserva biológica, Antônio de Pádua Almeida.
"Mas rio acima, sim", completou ele, chamando atenção para a necessidade
de reduzir a quantidade de lama acumulada nas cabeceiras, para que elas
não sejam arrastadas pelas chuvas para o oceano.
Até esta
segunda-feira, não havia sido detectada nenhuma tartaruga diretamente
afetada pela lama, mas a praia está sendo monitorada todas as noites
pelo projeto Tamar para realocar os ovos que são depositados ali para
outros locais. Uma análise visual da praia indicava que a lama não
estava "grudando" na areia, mas que os sedimentos mais finos estão se
acumulando alguns centímetros abaixo da superfície.
Com base no que viu nesta segunda-feira, a ministra
Izabella disse que a projeção de dispersão da lama no mar por enquanto
está correta, com a mancha mais espessa concentrada em uma área de
aproximadamente 10 quilômetros ao longo da costa e avançando 1,5 km mar
adentro. Havia relatos de extensões maiores, mas que, segundo ela,
referem-se a uma pluma de sedimentos mais finos, que tendem a se
dispersar mais superficialmente e não são a preocupação principal.
"O
monitoramento está sendo feito; se vai ampliar a mancha, nós vamos
saber", garantiu a ministra, repetindo que não há previsão de que os
sedimentos chegarão ao Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, no sul da
Bahia. A dispersão dos sedimentos é diretamente afetadas pelos ventos,
que empurram as massas de água para uma ou outra direção.
Novos
dados de monitoramento levantados pela Agência Nacional de Águas (ANA)
foram enviados à UFRJ para que o modelo de previsão possa ser
atualizado. Segundo o governador Hartung, é preciso "mais ciência e
menos achismo" na resposta ao desastre.
Toneladas
Ao
longo da calha principal do Rio Doce, peixes mortos continuam a
aparecer, principalmente nos trechos mais próximos a Minas Gerais, que
foram impactados há mais tempo. Há relatos de que 8 toneladas de peixes
mortos já foram recolhidas.
De Colatina para baixo, próximo à
foz do Rio Doce, ainda não havia mortandade generalizada, mas
pesquisadores acreditam ser apenas uma questão de tempo para que isso
ocorra, pois a concentração de sedimentos na água é tão grande que
"entope" as brânquias dos animais, além de exterminar o plâncton,
crustáceos e outros organismos dos quais eles se alimentam.
O
pesquisador José Augusto Senhorini, do Centro Nacional de Pesquisa e
Conservação de Peixes Continentais (Cepta-ICMBio), disse que pode haver
um intervalo de vários dias entre a chegada da lama e a morte dos peixes
- que depois de mortos ainda levam dois a três dias para boiar. Os
efeitos cumulativos do desastre sobre a fauna aquática do rio, portanto,
só poderão ser mensurados com o passar do tempo.
Uma boa notícia,
verificada nesta segunda-feira por meio de um sobrevoo, é que há um
grande reservatório de água na represa de Aimorés, na divisa de Minas
Gerais com o Espírito Santo, que não foi contaminado pela lama e está
cheio de peixes, e que portanto poderá servir como um reservatório de
vida para o repovoamento do rio mais adiante.
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