Por Julia Affonso, Fausto Macedo e Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba
O
juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Lava Jato, disse que a população
quer saber o 'efeito final' dos processos criminais, 'saber se a
Justiça funciona ou não'. "Não podemos ter a Operação Lava Jato como um
soluço que não gere frutos para o futuro", alerta Moro.Para o
magistrado, 'são necessárias reformas na legislação que aumentem a
efetividade do nosso sistema'. Moro avalia que o excessivo número de
recursos nas ações criminais 'forma uma cultura de impunidade". Para
ele, o grande desafio a ser enfrentado pelo Direito brasileiro é a
efetividade dos julgamentos criminais.
Sérgio
Moro falou sobre o tema na manhã desta segunda-feira, 10, no Tribunal
Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre. As informações
foram divulgadas no site do TRF4. O evento fez parte do curso "Direito
Comparado - corrupção e processo penal: experiência nos Estados Unidos e
no Brasil", promovido pela Escola da Magistratura (Emagis) da Corte
federal.
Moro fez uma comparação entre os
dois países. O juiz da Lava Jato criticou o adiamento da
punição. Segundo Moro, que é o responsável pelo julgamento em primeira
instância dos denunciados na Operação Lava Jato, a presunção de
inocência deve ter vínculo com a questão probatória. "No Brasil, existem
casos criminais em que a prova incriminatória é esmagadora,
mastodôntica, com a responsabilidade demonstrada, e o réu insiste em ir
até o final do processo, apostando na impunidade."
Moro fez referência a um artigo que escreveu em colaboração com o juiz federal Antônio Bochenek, publicado no Estadão,
em que ambos manifestaram a necessidade de uma alteração na legislação
do processo penal brasileiro que permita a prisão após a condenação já
em primeira instância, tornando excepcional a liberdade na fase de
recurso. "No Brasil vinculamos a presunção de inocência ao trânsito em
julgado do processo, e têm homicidas confessos que ficam 10 anos sendo
julgados em liberdade."
Sérgio Moro disse
que a legislação brasileira incentiva o recurso. ""Nos Estados Unidos, o
condenado responde a eventuais recursos já na prisão", ele observou. O
juiz destacou que o sistema judicial brasileiro se assemelha mais à
legislação italiana, caracterizando-se pela 'excessiva morosidade'.
Moro
usou como exemplo a "Operação Mãos Limpas" deflagrada naquele país
europeu na década de 1990, que culminou com um número de investigados
bem superior ao da Lava Jato. "O caso, ocorrido entre 1992 e 1994,
descobriu uma corrupção sistêmica disseminada na Itália. Cerca de 40%
dos crimes acabaram sem julgamento de mérito. Boa parte se perdeu nos
labirintos do processo penal italiano", lamentou.
Para
evitar um desfecho parecido em investigações de grande porte no Brasil é
que Moro insiste em uma mudança de cultura jurídica. Para ele, uma
ferramenta poderia ser o instituto da admissão de culpa, usado comumente
nos Estados Unidos.
O magistrado destacou
que na América 80% a 90% dos casos criminais encerram-se com o
reconhecimento da culpa, sendo resolvidos em nível regional. Para Moro,
nos casos em que a prova é esmagadora, não se justifica o tempo e o
custo do processo.No instituto da admissão de culpa, também conhecido
como transação penal, ocorre uma espécie de Justiça Criminal Consensual,
na qual os casos são resolvidos em negociações entre o indiciado e o
Ministério Público, evitando a abertura de processo criminal."
Para
a população, o que importa é o efeito final, é saber se a Justiça
funciona ou não. Não podemos ter a Operação Lava Jato como um soluço que
não gere frutos para o futuro. São necessárias reformas na legislação
que aumentem a efetividade do nosso sistema", avalia Moro.
Papel da mídia.
Questionado
por participantes do evento da Escola da Magistratura (Emagis) do TRF4
sobre os limites da imprensa no caso Lava Jato, Moro afirmou que a
Constituição diz que o processo é público e que o segredo de Justiça só
deve existir em dois momentos: para garantir a eficácia de uma
investigação e para evitar a exposição da vítima."
A
publicidade do processo é o preço que se paga por se viver em uma
democracia. É uma garantia à sociedade, principalmente em casos de
crimes contra a administração pública. Esses processos devem estar
submetidos ao escrutínio popular", concluiu.
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