A divulgação dos pedidos de
prisão dos senadores Romero Jucá e Renan Calheiros, do ex-presidente
José Sarney e do deputado afastado Eduardo Cunha – todos do PMDB –
levantaram questões sobre a real possibilidade de que elas sejam
concretizadas e sobre o possível impacto no cenário político e jurídico
brasileiro.
Em entrevista à
DW Brasil, o jurista Luiz Flávio Gomes, presidente do Instituto Avante
Brasil, afirma que de todos os pedidos, apenas o de Cunha parece ter
chance de ser aceito pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
"Com
base nos áudios, não vai ter prisão", afirmou o jurista, citando as
gravações realizadas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado,
que registrou conversas em março com Jucá, Renan e Sarney. Os diálogos
sugerem que eles tramaram para sabotar a Lava Jato.
Já
o pedido contra Cunha envolve uma avaliação da Procuradoria-Geral da
República (PGR) de que, mesmo após ser afastado do comando da Câmara por
ordem da Justiça, o deputado continua interferindo em seu funcionamento
para atrapalhar as investigações que tramitam contra ele na Casa.
Os
pedidos de prisão chegaram ao STF há mais de uma semana. O vazamento
deles pode ser encarado como uma forma de pressionar os ministros a
tomarem uma posição?
Os
vazamentos têm um objetivo mais amplo. Não é só pressionar ministro.
Eles fazem parte da estratégia da Lava Jato, que precisa do
reconhecimento da opinião pública, a destinatária final dos vazamentos.
Para ter a população ao seu lado, a operação tem que publicar suas
ações. Por tabela, esses vazamentos também alcançam os ministros. E se a
opinião pública se inflama, é claro que o STF se sente pressionado. O
próprio juiz Sérgio Moro já havia escrito há dez anos como vê a Lava
Jato: prisão, delação e vazamento para a opinião pública.
Detalhes
sobre os pedidos não foram divulgados, apenas as gravações de Sérgio
Machado. O senhor avalia que o conteúdo delas é suficiente para
fundamentar os pedidos de prisão contra Renan, Jucá e Sarney?
Não.
E isso porque não está mais caracterizado aquele estado de flagrância,
de que continuam a cometer crimes. Já passou. E só se pode prender
parlamentar em estado de flagrância. Mas só essas gravações se tornaram
conhecidas. O [procurador-geral da República, Rodrigo] Janot pode ter
provas mais contundentes. Com base nos áudios, não vai ter prisão. Eles
mostram uma articulação contra a Lava Jato. Agora, existe uma distância
entre o que é planejado e o que é feito. Nós não sabemos se eles fizeram
algo de concreto – e se isso ainda continua. Ou o Janot tem mais coisas
que a gente ainda não sabe, ou ele entrou num jogo arriscado.
Caso
existam provas mais contundentes, como o STF deve se posicionar em
relação aos pedidos? A prisão do ex-senador Delcídio do Amaral e o
afastamento de Cunha podem ser encarados como um precedente?
O
Supremo está reagindo contra toda essa cleptocracia brasileira, contra
as oligarquias que roubam o país e sempre ficam impunes. A Lava Jato é
uma reação. E o Supremo entrou nessa onda de endurecer. Primeiro foi a
prisão do Delcídio, depois a decisão de permitir prisões após julgamento
de segunda instância. O Supremo não quer ficar para trás. Porém, tudo
tem limite. A Constituição está aí, e é preciso preencher requisitos
para as decisões. Do contrário, o Supremo se torna um órgão arbitrário. É
preciso esperar Janot mostrar quais são as outras provas.
E
o caso de Cunha? Seu pedido de prisão aparentemente é baseado na
interferência dele nos trabalhos da Câmara, mesmo após seu afastamento.
A
questão dele é mais complexa. Por exemplo, comparando com o Renan,
Cunha pratica permanentemente atos que asseguram sua impunidade. Então,
de todas as prisões pedidas, a única que poderia sair é a de Cunha. O
caso do seu afastamento, em maio, demorou meses, mas quando foi julgado
não havia perdido aquela urgência, já que ele continuava a praticar os
atos – diferente do que se sabe até agora no caso de Sarney, Jucá e
Renan. Cunha continua dando margem.
É
a primeira vez que a PGR pede o afastamento e prisão de um presidente
do Senado. A Lava Jato está ficando mais agressiva em relação ao mundo
político?
Está. E
vai ficar cada vez mais. A Lava Jato começou a ser criticada por dar
muita atenção ao PT, por bater demasiadamente no partido. Se ela for
identificada com qualquer outro partido, então acabou, deslegitima tudo.
Só que agora entrou um novo grupo de oligarcas no poder. Ao ir pra cima
deles, a Lava Jato mostra imparcialidade e conserva a credibilidade com
a opinião pública.
Os pedidos de prisão estão testando um novo limite para a imunidade parlamentar?
A
imunidade tem que existir, sobretudo, para manifestações do parlamentar
em nome do interesse público. Mas uma imunidade que vem em defesa de
atos criminosos e corruptos vira privilégio. E temos que acabar com
isso. É preciso colocá-la dentro de limites. E esse momento é ideal para
discutir tudo isso. Atos criminais não podem estar amparados por
imunidade.
Autor: Jean-Philip Struck
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