O juiz Sérgio Moro, que esteve em Buenos Aires nesta semana para uma
conferência na Universidade Católica Argentina (UCA), disse em
entrevista ao Clarín que é difícil estimar um tempo para o fim
dos casos relacionados à Operação Lava Jato, mas que já cruzou a “metade
do rio”. Ele disse, porém, que na primeira instância, os processos dos
quais é responsável estão levando de seis meses a um ano. Sem citar
Eduardo Cunha, o juiz deu o exemplo do ex-presidente da Câmara, que
começou a ser investigado em setembro do ano passado e foi julgado na
semana passada.
“O problema é que vão surgindo provas de novos
acontecimentos, e por isso falo de uma corrupção sistêmica, não
isolada”, afirmou o magistrado, que disse ter se incomodado um pouco com
o que chama de “críticas não procedentes”. “Apesar de a opinião pública
brasileira estar, majoritariamente, a favor das operações, há uma
minoria mais crítica que às vezes incomoda. Principalmente quando se
tenta relacionar meu trabalho como se tivesse uma intenção
político-partidária.”
O magistrado falou, também, sobre a demora nos julgamentos que correm
no Supremo Tribunal Federal, que pode levar à prescrição dos crimes. Na
entrevista, ele destaca a decisão da Corte, no ano passado, de permitir
a execução de pena já a partir da condenação em segunda instância,
independente de recurso. “Essa regra de esperar até o fim era utilizada
para buscar impunidade por parte de criminosos poderosos. A lei tem que
proteger o acusado, tanto culpado como inocente, mas o sistema também
tem que permitir uma resposta institucional para estes delitos”, disse o
juiz ao jornal.
O magistrado afirmou que, apesar de um juiz não
julgar segundo o que diz a opinião pública, ela funciona como proteção
contra interferências indevidas em processos envolvendo “pessoas
políticas e economicamente poderosas”. Moro acredita, contudo, que o
Brasil tem um problema de crer em “salvadores da pátria”. “Isso é muito
infantil. É preciso construir as instituições dia a dia”, disse. “A
responsabilidade não é de uma só pessoa. Creio que existe um foco
excessivo sobre a mim, quando existe uma polícia que investiga, um
Ministério Público que acusa e mesmo no poder judicial há outros
tribunais que revisam minhas decisões.”
Em defesa da delação
premiada, recurso que tem sido amplamente utilizado nas investigações da
Lava Jato, Moro disse que há crimes praticamente secretos, em que
apenas os acusados podem prestar testemunho para descobrir-los. “O
problema é que, apesar de ser um colaborador, não deixa de ser um
criminoso”. O magistrado cita o exemplo bem-sucedido da delação do
ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que revelou onde recebia os
pagamentos de recursos desviados. “Eram contas no exterior que jamais
seriam descobertas sem sua colaboração.”
Na entrevista, também
falou sobre a negociação com diretores de empresas investigadas, como a
Odebrecth, já que a responsabilidade penal das companhias é caso em
discussão no Congresso argentino. “Creio que o melhor caminho é que as
empresas recuperem sua reputação. Uma empresa ‘recuperada’ é melhor que
uma empresa extinta”, disse o juiz, reconhecendo que o processo é
complexo. “A empresa deve reconhecer os delitos, adotar políticas
diferentes de transparência, eventualmente mudar seus executivos e,
principalmente, indenizar a sociedade.”
Moro falou sobre a
maturidade institucional no País, que permitiram a mudança de percepção
que a impunidade é a regra, e destacou como a corrupção pode gerar um
impacto na economia que não deve ser considerado. “Os países corruptos
podem competir em condições de igualdade em um mundo cada vez mais
globalizado em que os custos adicionais fazem diferença? A situação do
Brasil, com déficits crescentes, também está afetada pelos custos da
corrupção?”
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