O presidente interino Michel Temer assumiu o comando do país
na última quinta-feira tendo como sua maior missão colocar a economia
brasileira no prumo. Não é tarefa trivial: o produto interno bruto (PIB)
brasileiro encolheu 3,8% em 2015, deve ter retração similar neste ano
e, para 2017, a projeção é de estagnação, embora alguns analistas não
descartem mais um ano de encolhimento. "Conciliador" e "negociador
hábil" estão entre os clichês que têm definido o presidente interino ao
longo de sua carreira política - e esses termos serão testados ao limite
para que ele consiga levar adiante ajustes e reformas inadiáveis na
economia.
Temer não é um
expert em economia, mas já esteve à frente de empreitadas relevantes
nessa área. Talvez seu triunfo de maior relevo na seara econômica tenha
sido a criação do Código de Defesa do Consumidor, promulgado em 1990, do
qual o então deputado federal foi um dos autores.
Mas
houve insucessos nessa trajetória. Um deles, em particular, será um
imbróglio gigantesco a ser destrinchado pelo agora presidente interino: a
reforma da Previdência. Em 1996, Temer foi o relator escolhido pelo
governo do presidente Fernando Henrique Cardoso para aquela que, já na
ocasião, foi tratada como reforma da Previdência. Nas discussões
iniciais sobre o projeto no Congresso, Temer foi confrontado com um
aparente dilema ético: a proposta de reforma incluía o fim da
aposentadoria proporcional para servidores públicos, benefício que o
próprio Temer havia requisitado apenas três meses antes do início das
votações. Na ocasião, Temer disse que seu pedido era "ético e moral".
Ele foi mantido como relator da reforma.
A
tentativa de reforma, com Temer como relator, teve algumas vitórias,
entre elas a substituição do tempo de serviço pelo tempo de
contribuição. Mas alguns pontos centrais não foram adiante. Um deles:
não se conseguiu estabelecer uma idade mínima para aposentadoria no
país, a exemplo do que já fizeram a maioria dos integrantes da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, grupo de 33
países formado por economias desenvolvidas. Com o aumento da expectativa
de vida no Brasil, a ideia defendida por Temer na ocasião já é
considerada defasada: sua proposta era de idade mínima de 50 anos para
mulheres e 55 para homens para a aposentadoria.
As
propostas de reforma do governo foram entregues aos congressistas pelo
relator de maneira pouco usual: os deputados federais receberam cópias
da lista de propostas entre 22h e 1h - e com o documento cheio de
rasuras.
"Não
custa lembrar que o governo comprou, pagou e não levou os votos do
Acre", alfinetou o então senador Esperidião Amin (PPB-SC) sobre as
derrotas do governo - e de Temer - na (tentativa de) reforma da
Previdência. Amin, hoje deputado federal pelo PP, partido que teve o PPB
como embrião, tem sido apontado como um nome forte para assumir a
presidência da Câmara em caso de nova eleição para a mesa diretora. A
possibilidade de nova eleição surgiu com a suspensão do mandato de
Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Jogo do bicho e fim do CMN
- Temer já defendeu também a extinção do Conselho Monetário Nacional.
Formado pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente
do Banco Central, o CMN, como é chamado, é o órgão máximo do sistema
financeiro nacional. Suas decisões balizam, por exemplo, as decisões de
política monetária: cabe ao CMN, entre outras coisas, estabelecer a meta
de inflação a ser perseguida pelo BC.
A
proposta de extinção do CMN foi encampada por Temer em 1997 e seria,
supostamente, uma estratégia para dar mais agilidade ao BC para atuar em
momentos de crise. Os argumentos não encontraram muito eco, e o CMN
segue ativo.
Até o jogo do
bicho já entrou nas propostas de Temer para a área econômica. Em 1984,
quando assumiu pela primeira vez a Secretaria de Segurança Pública de
São Paulo, ele entregou ao Ministério da Justiça um estudo em que
afirmava que a legalização "implicaria na abertura de um novo mercado de
trabalho, além de eliminar mais um tipo de fiscalização à polícia."
A
maior motivação da proposta, segundo seus argumentos na ocasião, era
eliminar focos de corrupção na polícia, além de manter as forças de
segurança concentradas no combate a crimes contra o patrimônio e
pessoas. Mas o lado econômico da proposta de legalização do jogo do
bicho não era desprezível. A ideia de Temer era que 50% da arrecadação
fosse para o município a aposta fosse e 50% para o Estado. O dinheiro
seria destinado a "investimentos sociais".
Michel
Temer, o presidente interino, assume um país ainda sem reforma da
Previdência, com o Conselho Monetário ativo, com o jogo do bicho ainda
na ilegalidade - e com sua recessão mais severa em quase um século. As
habilidades de negociador enfrentarão seu maior teste a partir de agora.
O presidente da República em exercício, Michel
Temer, dá posse para o seu novo ministério em cerimônia no Palácio do
Planalto, em Brasília (DF) - 12/05/2016
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