A fosfoetanolamina sintética, que ficou conhecida como pílula do câncer, não é eficaz
para o tratamento de tumores. É o que revelam os resultados da segunda
fase do estudo clínico realizado pelo Instituto do Câncer de São Paulo, o
Icesp, divulgados nesta sexta-feira. Devido à ausência
de “benefícios clínicos significativos”, o instituto decidiu suspender
os testes com a substância.
Estudo
Os
testes em humanos tiveram início em julho do ano passado, após forte
pressão popular. A primeira etapa da pesquisa clínica avaliou a
toxicidade da fosfoetanolamina. Os resultados mostraram que o produto
não apresentava risco de efeitos adversos graves.
Nesta segunda
etapa, o objetivo era comprovar a eficácia da substância. O plano era
incluir 20 participantes em cada um dos dez grupos de tumores – cabeça e
pescoço, pulmão, mama, cólon e reto, colo uterino, próstata, melanoma,
pâncreas, estômago e fígado -, totalizando 210 pessoas em
acompanhamento. Estatisticamente, a substância teria efeito se pelo
menos três pacientes de cada subgrupo apresentassem uma redução de 30%
do tumor. Não foi o que ocorreu.
Resultados aquém do esperado
Até
o momento, 72 pacientes, de dez diferentes grupos de tumores, foram
tratados com a fosfoetanolamina. Destes, 59 foram reavaliados e 58 não
apresentaram resposta objetiva, de acordo com os médicos. Apenas um
indivíduo, com melanoma, apresentou resposta ao tratamento.
O
grupo de câncer colorretal foi o primeiro a completar a inclusão de
todos os pacientes previstos nesta fase, e foi encerrado, pois nenhum
paciente apresentou resposta objetiva ao tratamento. Nos últimos oito
meses os pacientes passaram por avaliações periódicas, com retornos
entre 15 e 30 dias, para a realização de consultas médicas e exames,
dentre eles a avaliação da doença por tomografia, o que permite
acompanhar de perto a evolução do câncer em relação ao uso da “pílula do
câncer”.
Pesquisa suspensa
Como os resultados de
reavaliação estão sendo muito inferiores ao desejável, em todos os
grupos, a inclusão de novos pacientes está suspensa. O protocolo será
reavaliado antes de qualquer continuidade, segundo a Secretaria Estadual
de Saúde de São Paulo.
Os pacientes envolvidos no projeto vão continuar em tratamento no Icesp normalmente, com acompanhamento da equipe de oncologia.
Histórico
O composto foi desenvolvido pelo químico Gilberto Chierice, no laboratório do Instituto de Química da Universidade de São Paulo, em São Carlos.
Ele passou a distribuir as cápsulas da substância para pessoas que o
procuravam no local. Desde o fim de 2015, enormes filas de familiares e
pacientes, entre crianças e idosos debilitados pela doença, eram
formadas em frente ao Instituto em busca do ‘remédio milagroso’. O drama
ganhou destaque quando uma liminar do Supremo Tribunal Federal
autorizou a entrega das pílulas a um doente do Rio de Janeiro. A
decisão provocou uma avalanche da ações judiciais, que ultrapassaram
20.000.
O clamor popular acabou pautando deputados, senadores e a
presidente, que enfrentava um momento de baixíssima popularidade. A
produção e comercialização da fosfoetanolamina sintética como droga
anticâncer chegou a ser autorizada no Brasil, em abril de 2016, por um
projeto de lei aprovado no Congresso e sancionado pela então presidente Dilma Rousseff. Mas
a lei foi suspensa no mês seguinte por uma decisão do STF. A falta de
comprovação científica sobre sua real eficácia sempre foi questionada
por oncologistas, entidades médicas e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, que criticava abertamente sua aprovação. O estudo, realizado pelo Icesp, tinha o objetivo de verificar o efeito da substância.
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