DONO DA
UTC E EXECUTIVO DA ODEBRECHT SÃO LÍDERES DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, DIZ MPF
Por Fausto Macedo, Julia Affonso e Ricardo Brandt
A força-tarefa da Operação Lava Jato apontou o dono
da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, e o executivo da Odebrecht, Márcio Faria,
como líderes da organização criminosa denunciada à Justiça Federal, que entre
2004 e 2014 teria desviado mais de R$ 6 bilhões da Petrobrás, por meio do
pagamentos de propinas, que variavam de 1% a 3% dos contratos da estatal, a
agentes públicos e políticos. É a primeira vez que a força-tarefa indica um
empresário da Odebrecht, maior empreiteira do País, como um dos mandantes do esquema
que teria desviado recursos da estatal.
“Na organização de tal esquema, comandando o núcleo
econômico, estava Pessoa e Márcio Faria, o primeiro pela UTC e o segundo pela
Odebrecht. Ambos dirigiam as atividades da Orcrim (organização criminosa)”,
registram os nove procuradores do Ministério Público Federal, que subscrevem a
primeira alegação final de uma ação penal envolvendo executivos do cartel como
réus.
Os executivos da Odebrecht ainda não foram
denunciados pela Lava Jato. A empreiteira e seus dirigentes são alvos de
inquérito da Polícia Federal. A empresa nega envolvimento com o esquema. Faria
e outros dois executivos, Rogério Araújo e Alexandrino Alencar, foram apontados
em delações premiadas como elos do cartel e das propinas no esquema da Petrobrás.
O processo em que os Procuradores apontam o papel
de liderança do dono da UTC e do executivo da Odebrecht responsabiliza três
executivos da Camargo Corrêa – afastados dos cargos em novembro, após serem
presos pela Lava Jato -, Dalton Avancini, ex-presidente; Eduardo Leite,
ex-vice-presidente; e João Auler, ex-presidente do Conselho de Administração da
empreiteira. Eles são acusados de corrupção, lavagem de dinheiro e organização
criminosa.
Pessoa também é réu no processo da Camargo Corrêa,
no entanto, a força-tarefa deixou de apresentar pedido de condenação contra
ele. O motivo é notícia de que o empresário está em tratativa de delação
premiada com a Procuradoria Geral da República, no âmbito dos inquéritos que
envolvem políticos – que têm foro especial por prerrogativa de cargo.
“Pessoa tinha função de destaque na convocação de
reuniões e na formulação das regras para a divisão de obras, eliminação da
concorrência e fraudes aos certames”, explicam os procuradores.
Para isso, destacam a delação premiada de Leite, um
dos executivos da Camargo, em que diz como funcionavam as reuniões do cartel.
Os três executivos da empreiteira estão presos em regime domiciliar.
“Esse grupo já era formado, e tinham empresas e
pessoas tradicionais nesse setor (óleo e gás). Então a Odebrecht e o Márcio
Faria era uma pessoa que era líder, era, já trabalhava há muito tempo, sei lá,
mais de 20 anos talvez, aí nesse setor. Da mesma forma, o Ricardo Pessoa também
era uma pessoa que tinha realmente uma, então naturalmente eles eram pessoas
que tinham maior capacidade aí de conversar com as empresas, conhecimento das
empresas, das outras empresas.”
No memorial, penúltima fase do processo antes do
juiz federal Sérgio Moro dar sua sentença, os procurados assim descrevem o
esquema desbaratado pela Lava Jato: “Apurou-se um gigantesco esquema criminoso
voltado para a prática de crimes contra a empresa Petrobrás, o qual ocorria
através de um núcleo econômico formado pelas grandes construtoras do País, que
constituíram um verdadeiro cartel”.
Segundo a força-tarefa, “houve o pagamento de
propina a pessoas que detinham altos cargos na referida estatal, além de
agentes políticos, a fim de preservar o alto lucro das empresas formadoras do
cartel e a divisão das obras na forma escolhida pelos executivos das
empreiteiras. Frustrava-se, assim, a competição dos certames e garantia-se a
hegemonia das empresas cartelizadas”
Núcleos. No processo, os
acusados foram divididos em núcleos, agrupados por seu papel no esquema
criminoso instalado de 2004 a 2014. “O primeiro núcleo era formado pelos
administradores das empreiteiras Odebrecht, UTC, Camargo Corrêa, Techint,
Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Promon, MPE, Skanska, Queiroz Galvão, Iesa,
Engevix, Setal, Setal Óleo e Gás, GDK e Galvão Engenharia, voltando-se à
prática de crimes de cartel e licitatórios contra a Petrobrás, de corrupção de
seus agentes e de lavagem dos ativos havidos com a prática desses crimes.”
Os procuradores afirmam que “o núcleo formando
pelas empreiteiras, aproveitando-se da garantia de altos lucros pela eliminação
da concorrência, subverteu fundamentos da República Federativa do Brasil, como
a livre concorrência e o pluralismo político”.
“As empreiteiras reuniram-se em conluio para
inicialmente fraudar a concorrência dos certames da Petrobrás; posteriormente
tal prática se tornou sofisticada, ocorrendo reuniões com representantes das
empresas cartelizadas para a divisão de obras mediante regras previamente
estabelecidas.”
Partidos. São quatro núcleos,
segundo MPF. Além do núcleo econômico, o segundo é o de agentes públicos
corrompidos pelos integrantes do primeiro. “Passando a auxiliá-los na
consecução dos delitos de cartel e licitatórios. O terceiro núcleo era
integrado por operadores do mercado negro que atuavam para operacionalizar o
pagamento das vantagens indevidas”, além de promover a lavagem do dinheiro.
O quarto núcleo é o de políticos, sendo que a
maioria segue investigada nos casos que estão no Supremo Tribunal Federal. Três
deles já foram denunciados em primeiro grau, André Vargas (ex-PT, hoje sem
partido), Pedro Corrêa (ex-PP) e Luiz Argôlo (ex-PP, hoje afastado do SD).
Segundo os procuradores, Avancini, Leite e Auler
integraram o núcleo empresarial do esquema, que pagava de 1% a 3% de propina a
agentes públicos indicados por PT, PMDB e PP em diretorias da Petrobrás. Em
troca, o grupo controlava e dividia contratos bilionários – 16 empresas são
apontadas no cartel. O desvio já reconhecido pela estatal é de R$ 6 bilhões.
No caso desse processo em que o MPF pediu a
condenação de três dirigentes da Camargo Corrêa, o caso envolve os atos
praticados na Diretoria de Abastecimento, que era cota do PP no esquema.
Na ação contra o trio da Camargo, os procuradores
pedem o “perdimento do produto e proveito dos crimes”, num total de R$ 50,8
milhões, e multa de R$ 343 milhões, correspondente a 3% do valor dos contratos
e aditivos mencionados na denúncia, relativos a obras da empreiteira nas
refinarias Getúlio Vargas (Repar), no Paraná, e Abreu e Lima (Rnest), em
Pernambuco, além do Complexo Petroquímico do Rio (Comperj).
Os projetos foram contratados pelo ex-diretor
Paulo Roberto Costa. Ele e o doleiro Alberto Youssef, delatores da Lava Jato,
também são réus nessa ação, além dos “carregadores de mala” Adarico Negromonte
e Jayme Alves de Oliveira, o Careca.
Esses são os primeiros memoriais apresentados
pelo Ministério Público em ação penal contra membros do núcleo empresarial.
Nessa etapa do processo, a acusação reforça o pedido de condenação feito na
denúncia usando como base provas colhidas na fase de instrução. Há ainda outras
cinco ações contra ex-dirigentes de mais cinco empreiteiras contratadas pela
estatal.
“Tais empresas em momento algum podem ser
referidas como se tivessem feito parte do progresso da Nação, pois, através dos
seus dirigentes, corromperam diversos agentes públicos e impediram o sucesso de
empresários que atuam dentro dos ditames legais.”
Ricardo Pessoa admitiu ter praticado atos
ilícitos e aceitou fazer um acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral
da República para revelar o que sabe sobre o esquema criminoso em troca de
benefícios como redução da pena.
COM A PALAVRA, A DEFESA
CONSTRUTORA NORBERTO ODEBRECHT
“A Odebrecht nunca participou de cartel, nem de
oferecimento ou pagamento de propina em contratos com qualquer cliente público
ou privado. Para o entendimento geral, é importante ressaltar que sempre foram
públicas as desavenças entre a Camargo Corrêa e a Odebrecht na disputa de
importantes contratos, o que não surpreende que o presidente da Camargo,
sentindo-se obrigado a prestar declarações em troca de sua liberdade, o faça
motivado por um sentimento de vingança concorrencial.”
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