Em setembro, a agência Standard & Poor's já havia tirado o grau de investimento do país, cortando sua nota de BBB- para BB+, considerado grau especulativo.
Outra agência, a Moody's, também rebaixou o Brasil há cerca de dois meses, mas manteve o selo de bom pagador, com perspectiva estável, o que sugere que não deve fazer alterações na nota do país no curto prazo.
Em seu relatório, a Fitch citou a desaceleração econômica, a crise política - e seu impacto nas medidas de ajuste fiscal - e a perspectiva de piora do perfil da dívida pública como justificativa para o corte da nota.
A agência também deu a sua classificação um viés de baixa. Isso significa que o mais provável é que sua próxima decisão seja um novo rebaixamento, o que levaria o país para o grau especulativo.
Mas, afinal, por que esse novo rebaixamento importa?
A avaliação do mercado é que o risco de um país com grau especulativo dar um calote em seus credores é significativo.
Por isso, a perda do grau de investimento tende a enxugar e encarecer o crédito (ou seja, o dinheiro disponível para empréstimos) para um país e para as empresas ali sediadas. Esse rebaixamento também contribui para uma saída de dólares e o enfraquecimento da moeda local.
"Em um cenário em que as empresas já estão passando por dificuldades em função da crise e queda do consumo interno, essa pressão financeira adicional pode ser bastante complicada", disse à BBC Brasil o economista Thiago Biscuola, da RC Consultores.
Placar
No atual cenário, há uma agência classificando o Brasil como grau especulativo - a S&P - e outras duas, como grau de investimento - Fitch e Moody's.Mas, na avaliação de analistas, a decisão da Fitch de cortar a nota brasileira e dar à nova classificação viés de baixa parece confirmar que essa agência tende a seguir o caminho da S&P.
"A Fitch era a única das três principais agências de classificação de risco que mantinha a nota do país a dois pontos da perda do grau de investimento", nota Biscuola.
"Com a mudança, se não houver uma grande alteração no cenário político e econômico, que consideramos pouco provável, a perda desse selo de bom pagador é bastante provável."
A questão é que quando duas dessas três grandes agências de classificação de risco rebaixam um país para grau especulativo, muitos fundos de pensão e de investimento são obrigados, por seu estatuto, a retirar os recursos que possuem aplicados em títulos e papéis desse país.
"Por isso, a tendência é que o impacto de um novo rebaixamento no mercado seja significativo, ainda que muitos agentes já estejam revisando seus investimentos no país, antecipando esse movimento", diz Biscuola.
Para Marcos Mollica, da Rosenberg Partners, as reverberações de um segundo rebaixamento, quando e se ele for de fato anunciado, devem ser relativamente pequenas, mas os investidores já estão ajustando suas posições para esse cenário.
"No caso, haveria uma pressão temporária no mercado, mas coisa marginal, porque todo mundo está se antecipando. Ninguém vai ficar esperando que o segundo rebaixamento ocorra para atualizar seu portfólio", diz o economista da Rosemberg Partners, acrescentando que o novo corte é esperado para o primeiro semestre de 2016.
Reação do mercado
André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, diz que o mercado reagiu com relativa tranquilidade ao corte da nota pela Fitch porque já esperava seu anúncio."Mas certamente essa não é uma boa notícia para o Brasil", afirma.
Com a nova nota, segundo o economista da Gradual, o Brasil fica no mesmo patamar de países como Índia, Uruguai, Turquia, Filipinas, Rússia, Bulgária e Romênia.
Uma
queda de dois degraus na nota brasileira - que teria levado o país do
BBB direto para o grau especulativo - em tese seria possível, mas muito
pouco provável, segundo explicam Biscuola e Mollica.
"O
mais provável é que o ajuste seja sempre gradual, a não ser no caso de
um evento extremo, como guerra ou crise geopolítca", diz o analista da
RC Consultores.
Ao participar
de um seminário em São Paulo nesta quinta-feira, o diretor-executivo da
Fitch no Brasil, Rafael Guedes, explicou à Agência Estado que "a Fitch
geralmente não faz rebaixamento em dois graus de uma vez (...) a menos
que haja um evento que mude estruturalmente a expectativa com relação ao
país (analisado)".
Guedes também disse que mesmo que 2016 seja um ano difícil, a mudança do rating do Brasil não pode ser dada como certa. "Quando fazemos essa avaliação, estamos olhando para o médio e longo prazo", disse.
Segundo
o diretor-executivo da Fitch, se o governo mostrar que está "ciente dos
problemas" ligados ao crescimento e ao superávit primário e que
pretende "atacá-los", "mesmo que 2016 seja um ano difícil, isso não
necessariamente levaria a mudança no rating".
Questionamentos
Os
vereditos das agências de classificação de risco servem de orientação
para investidores em busca de oportunidades para aplicar seu dinheiro.
Mas, nos últimos anos, a atuação dessas agências também tem sido alvo de
críticas.
Para os críticos, o
estouro da crise financeira global em setembro de 2008 e a falência do
banco americano Lehman Brothers colocou em xeque a credibilidade dessas
agências. O banco tinha nota "A" quando quebrou.
Outra
polêmica envolvendo as agências ocorreu em 2011, quando a S&P
reduziu a nota dos Estados Unidos de AAA para AA+ pela primeira vez na
história. Na época, o prêmio Nobel de Economia Paul Krugman defendeu que
a agência seria "a pior instituição à qual alguém deveria recorrer para
receber opiniões sobre as perspectivas do nosso país (EUA)".
Em
2012, o órgão fiscalizador da União Europeia para a indústria de
serviços financeiros, a Esma, publicou uma avaliação do trabalho das
três agências, apontando problemas de transparência.
Analistas
de mercado costumam admitir que a reputação das agências foi abalada
nos últimos anos, mas ressaltam que até hoje não foi criada nenhuma
alternativa a essas instituições - e os investidores precisam dessas
informações e avaliações sistemáticas para saber onde colocar seus
recursos.
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